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TÍTULO: Um Namoro de Outros Tempos |
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LOCAL: Portugal - Landim, Famalicão |
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DATA: 1997 |
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INFORMANTE |
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SEXO: F |
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IDADE: 73 anos |
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ESCOLARIDADE: 4 anos |
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PROFISSÃO: Doméstica |
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OBSERVAÇÕES: Participam na conversa o marido da informante, uma irmã desta e um vizinho, todos da mesma região. |
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- o que eu gostava que me contasse era: como é que conheceu o seu marido? como é que isso aconteceu? |
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-> ele é que me procurou. |
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- mas como é que foi? conte-me tudo! |
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-> ai não, ai nossa senhora, ai como é que hei-de contar? |
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- ai não olhes para mim [...] |
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- foi na romaria? |
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- tu é que sabes. |
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-> eu como é que hei-de contar? |
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- ora... |
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- não foi na romaria que o conheceu? |
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-> olhe, foi à vinda da igreja |
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- vinha da igreja |
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-> dantes a gente ia ao terço, às ta[...] - agora não há |
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- ham, ham. |
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- e ele vinha do terço e, e s[...], perseguiu-me, pronto. |
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- eu, [...] |
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- mas ele já a co[...], já a conhecia antes? ele já a conhecia antes? |
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-> não, isso não sei. a primeira vez foi à vinda do terço. |
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- mas a, a senhora não o tin[...], nunca o tinha visto? |
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-> não senhor. |
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- ah, foi assim? |
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-> podia até vê-lo, mas sabia lá. |
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- não sabia quem era. |
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- ia passear à montanha. |
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-> [...] |
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- e então quando viu que vinha aquele rapaz atrás de si, o que é que pensou? |
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-> eu não pensei nada, ele é que veio falar para mim. |
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- e o que é que ele lhe disse? |
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-> ai eu agora sei lá! |
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- mais ou menos. |
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-> como ele entendeu. |
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- a primeira vez não deu resultado. |
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-> atrás de mim vinha o meu pai |
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- ham, ham. |
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-> do terço [...] |
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- a primeira vez |
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-> então contas tu [...] |
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- foi no dia da inspecção. |
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- espera, espera, espera, espera, espera, espera. |
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-> prontos, vai lá então. |
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- ela conta e depois o senhor conta a sua versão. |
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- um de cada vez. |
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- é uma versão de cada um. diga lá. |
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-> atrás de mim, o nosso pai também ia ao terço e levava-nos, pronto, éramos católicos e somos, e depois ele levava uns socos, um tamancos, também não era como agora, eram tamancos e eu disse assim "ai, sai daqui que vem aí o meu pai" e ele nã[...], ainda não o conheceria, não é, e eu "não venhas para a minha beira", eu assim "que agora vem aí o meu pai, vem aí atrás de mim" e ele, pronto, retirou-se um bocado e eu vim para baixo. naquele dia não... me falou nada. depois tornou-me outra vez a perseguir, ah, outras vezes fui ao terço e ele foi também. foi também! ele vinha de Castelões, se ia ou não, não sei, ele andava por ali. |
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- [...] para beber uma pinga. |
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-> prontos. então, havia lá um tasco à beira |
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- [...] |
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-> e ele em vez de ir para o terço até eu sair da igreja, foi para o tasco. tornou-me a perseguir. pronto, e daí, começou depois |
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- olhe, e quando viu que andava aquele rapaz a persegui-la, como é que o seu coração ficou? |
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-> eh, ó meu Deus, ó senhor, desculpe, ele também tem de desculpar, eu antes destes vieram outros. |
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- ai é?! |
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-> eu tive muitos mais. |
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- ai não foi o primeiro?! |
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-> ah, pois não foi, ah! eu não estou a mentir! |
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- ah! |
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-> vieram outros. mas eu, prontos |
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- não ligava. |
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-> calhou, calhou de ser, não liguei a muitos, foi verdade. que até dois já estão viúvos e outros assim, pronto. e depois a, pronto, ali calhou de ligar a este, depois |
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- está bem [...] |
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-> depois eu disse-lhe "vai-te embora que...", eh, eh, desculpei-me |
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- diz lá. |
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-> "que a minha mãe não, não me deixa conversar. não me deixa, pronto, e eu não estou para andar por aí..." e ele depois, eh, esteve para aí dois meses ou três, depois tornou a vir. então depois tu[...], prontos, digo assim "bem! sei lá se é para, tem de ser ou não tem". foi assim. |
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- portanto, gostou mais deste do que dos outros. |
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-> mas tive mais, pulha. e ele também teria outras raparigas, pulha |
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- sim. |
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-> ele também diz que teve mais raparigas, mas pronto. |
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- sim. mas porque é que gostou mais deste do que dos outros? |
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-> ó senhor, calhou! pronto. [...] |
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- devia haver alguma coisa de especial. |
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-> eu não posso dizer, ah, então, não houve nada de novo, graças a Deus, não houve nada de especial, de novo |
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- hum, hum. |
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-> cá não houveram frocotiques. |
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- muito bem. e depois então começaram a conversar. |
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-> é, começámos a conversar. |
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- sim. |
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- mas é |
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- e o seu pai teve que dizer que deixava. |
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-> nós tínhamos de, não podia ir para longe de casa, que nossa mãe não nos dava essas rédeas. eu tinha de estar, a minha mãe dizia mesmo "tu tens de estar onde eu... chame e tu me fales logo". |
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- hum, hum. |
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-> e eu era assim. chamava e eu tinha de lhe falar logo. senão |
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- então a senhora quê, ia só ali |
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-> senão elas caíam |
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- para baixo para a rua? |
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-> como? não senhor. |
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- ia, descia. |
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-> não, não |
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- ah. |
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-> a, na, a casa dos meus falecidos pais é ali por trás. |
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-ah. |
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-> ele até se vê da, daqui do telhado. |
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- hum, hum. |
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-> e até tinha assim um, também assim, ainda é mais assim escondido que aqui, é um recanto [...] |
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- ela vê-se daqui, destas pedrinhas, vê-se dali. |
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-> ela vê-se. |
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- hum, hum. |
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-> pronto, e eu comecei, ele começou-me a perseguir, prontos, e eu... calhou assim. mas eu tinha de estar onde eu, eh, ela dizia-me "tens de estar onde eu te chame |
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- [...] teve muita sede |
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-> onde eu chame por ti e tu me fales". foi assim. |
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- [...] |
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-> e eu tinha de lhe falar. |
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- e quanto tempo... |
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-> só dez minutos. |
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- ham, ham. |
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- dez minutos, não havia mais? |
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-> não me deixavam estar mais, pronto. |
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- quanto tempo durou esse namoro? |
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-> olhe, não foi muito. foi para aí, seria dois anos? |
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- ah! |
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-> seria dois anos, não, nem tanto. |
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- que idade tinha a senhora, na altura? |
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-> tinha vinte e sete anos quando casei. |
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- então já... |
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- [...] |
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- [...] |
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- já era crescida. |
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-> já era crescida, criada, graças, tinha vinte sete anos. |
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- olhe |
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- hum. |
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- e se comparasse |
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-> e, e ele tinha vinte e oito. |
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- ah, se a senhora comparasse o, a maneira de namorar dessa altura |
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-> oh! |
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- e a maneira de namorar de agora, acha que é muito diferente? |
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-> oh, esteja, oh, esteja caladinho. |
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- porquê? |
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-> a maneira de namorar de agora é um nojo. |
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- porquê? |
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-> porque a gente vê as coisas. agora não, não ando, mas eu bem sei como é. até se vê nas televisões. |
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- sim. |
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-> eh, isto agora não é, dantes não era na[...], Deus me livre de dantes tocar... um, um, um rapaz numa rapariga. bem, não seria todos, vá. olhe que o nosso falecido pai, uma vez, - ele bem se ri - o nosso fal[...] - já lá está - deu com nós ali a conversar. ele ia com umas cordas na mão, ia buscar um molho de coroas, sabe como é, dos milhos |
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- sei. |
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- hum. |
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-> cortar para o gado, aquelas coroas. |
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- sim. |
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-> e eu i[...], ia a, estava ali à beira de uma casa - os senhores não conhecem, não vale a pena dizer o nome da pessoa, não é, - e estava ali. e o meu falecido pai lá foi ver se |
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- [...] |
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-> se haveria alguma coisa de novo. os senhores querem saber eu digo, não é, |
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- [...] |
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-> e ele, e e[...], e eu estava desviada do meu homem |
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- [...] |
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-> por exemplo, o meu homem estava aqui e eu estava ali, assim, assim, é verdade, era assim. e ele foi, e eu assim que vi a sombra do meu pai - nós já falávamos há uns mesicos, porque ele depois deixou e tornou a vir. também foi contado esse tempo - eu assim que vi assim uma sombra, olhei para trás, o que vale, ele estava - ele bem sabe que é verdade - estava desviado e eu também, e assim que vem a sombra do meu pai eu tremia. parece que até, pus-me amarela. e eu então fiquei assim. e ele foi assim, saiu. deixou-me ficar. eu fiquei assim, fui para o lado de casa e ele, foi assim, pronto. e depois, eh, o meu pai dizia assim "eu, se tu deres, se tu c[...], entenderes que dás uma treta" - chamava-lhe ele assim - "a um amigalhote qualquer, tu tens de estar de longe, que se vos eu topo perto, mato-te". e então, disse-me isso algumas vezes. uma vez também nos topou assim desviado e foi ao, ao... ao penso para os animais - chamamos nós os pensos |
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- o penso. |
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-> cortar aquelas coroas que o milho puxa |
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- ham, ham. |
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- hum, hum. |
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-> e o meu homem tinha falado comigo em falar o casamento e em vez de, seguiu o meu pai, seguiu o meu pai, prontos. [...] e pronto; e depois ele é que lá falou o casamento. não, não andei muito tempo na conversa, não. |
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- hum. |
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-> não, que a nossa mãe não queria. dizia assim "ou para uma banda ou para a outra". se quiseres casar, se quiseres um moço, casais, e se não quiseres, larga, eu não estou para andar a pa[...], a espreitar ninguém, nem, não ando agora atrás de ti." ó senhor, não era preciso andar atrás de mim, mas ela tinha a ideia que, que tinha de olhar por mim, pronto. |
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- hum. |
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-> mas já tinha de, já era de maior idade, não é, |
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- pois, de facto. |
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-> mas dantes não era assim, de como agora se vê, prontos. |
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