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Angola | Luanda | M | 40 | 1997 | eh, doutor João Serôdio, os fluxos migratórios que ultimamente se têm registado, um pouco por toda a África, e também dentro do nosso país teriam provocado graves consequências ao ambiente. em volta disto, o que há a dizer-se?. os fluxos, os fluxos migratórios que sempre houve em todo o mundo provocados por desgraças, por guerras, fomes, secas, etc., por cataclismos naturais ou artificiais, dependendo da quantidade de pessoas que se mo[...], que se m[...], m[...], mobilizam de um lado para o outro, claro que traz sempre grandes desvantagens, sempre grandes desequilíbrios ambientais. nós sabemos que o ser humano como qualquer outro animal, desde que ultrapasse... a u[...], a u[...], a capacidade de utilização da natureza, essa natureza tem que ficar prejudicada, tem que ficar de[...], depletada, tem, tem que desaparecer, árvores, plantas, frutas, ah, exi[...], depo[...], co[...], surgem os problemas de erosão pelo excesso de passagem de pessoas, de movimentação, basta apenas os pés a baterem no chão para poderem de[...], desagregar terrenos, para poderem, depois, com a acção das chuvas, essas... pequenas, esses caminhos, não é, serem... utilizados, serem, através das chuvas, do movimento das águas que corre, não é, sobre essa superfície lisa, arrastarem terras, e começam a surgir as, as, as ravinas, pequenas ravinas primeiro, depois maiores ravinas se não houver um trabalho contrário. portanto, sempre que há uma movimentação excessiva de pessoas de um lado para outro, claro que sempre, isso sempre t[...], são, eh, transformadas em problemas ambientais. isto, mesmo que não haja grandes quantidades de pessoas, basta apenas transferir populações de um, de uma dado, de um determinada zona ecológica, habituados a fazer uma agricultura que aprenderam ao longo de milhares de anos com a experiência do erro... cometido, portanto, acerto, erro, acerto, erro, acerto, as populações que se habituam a viver em determinadas áreas aprendem a viver em equilíbrio com a natureza. se, de repente, por qualquer motivo, você pegar essas populações de populaçõ[...], de... rurais, portanto, de agricultores e transferi-los para uma zona ecológica que eles não estão habituados, a primeira coisa que eles vão fazer é pôr em prática aquilo que estão habituados a fazer. portanto, os, os cultivares que eles vão fazer, as, os amanhos da terra vão ser adaptados à zona donde eles são originários. aí começam os desequilíbrios, porque provavelmente, naquela nova zona onde eles estão, se tiver condições ecológicas diferentes, claro que o amanho, o, a gestão da terra tem que ser de formas diferenciada daquelas donde eles são originários. portanto, já isso, mesmo que não haja excesso de populações, mesmo isso já prejudica a própria natureza. agora imagine o que se passa no Rwanda em que são milhões de pessoas que se deslocam e ficam concentradas durante meses no mesma região em que destroem completamente todo o coberto vegetal. claro que isso é um cataclismo mesmo.. eh, doutor João Serôdio, no nosso caso de Angola, com as movimentações constantes de grupos de pessoas, eh, provocadas por situações de guerra, essa questão não se põe também?. problemas ecológicos, como disse, já dei há bocado o exemplo, acontecem em Angola permanentemente e acontecem desde a independência de Angola. a transferência de populares, camponeses, por exemplo, do planalto central para as regiões de Luanda, regiões de Benguela e Lobito, o Namibe inclusivamente, em que eles vêm com hábitos culturais do Lubango, do Huambo, por exemplo, da província do Huambo, onde chovem mil e seiscentos milímetros por ano, e vão para as zo[...], zonas semi-áridas, mas as técnicas de cultivar são as mesmas que eles utilizavam no Huambo. claro que esssas, essa situação prejudica imediatamente as situações, a, a, a, os locais para onde são levados, o exemplo, Luanda, à volta de Luanda, à volta do Lobito, Benguela, e mesmo Namibe que é um deserto, as populações do su[...], planalto central ao deslocarem-se para ali provocaram dese[...], dese[...], grandes desequilíbrios ecológicos locais, na, na, no, no, nesses locais. primeiro, porque é uma zona semi, são á[...], zonas semi-áridas, não é, toda a costa angolana, mais ou menos, inclui-se numa, numa, numa zona que ecologicamente se diz semi-árida, ou, e, e esse, e essa situação semi, dessa, essa, esse bioma semi-árido tem características de equilíbrio muito especiais. se nós alterarmos esse equilíbrio, claro que estamos a destruir a natureza. portanto, em Angola, está farta de ter exemplos, por toda a Angola, está farta de ter exemplos de destruição ambiental. não é preciso ir muito longe, a própria população do Huambo, que se concentrou devido à guerra, aos, aos problemas da guerra e ao desequilíbrio... políticos e militares, que se concentrou durante anos à volta das cidades. hoje à volta da cidade do Huambo, ess[...], à volta da cidade do Bié, praticamente o terreno está completamente despido de vegetação. e v[...], nota-se de avião quem chega, não é, eh, porquê? era até, as populações locais iriam até onde podiam ir. ainda ontem, por exemplo, de Saurimo, nós saímos da cidade de Saurimo, que é uma cidade pequenina, mas onde existem, neste momento, vinte ou trinta mil desem[...], eh, desempregados, portanto, pessoas refugiadas e, a toda à volta de Saurimo, pelo menos num raio de dez a vinte quilómetros não há vegetação, não há árvores. árvores todas foram destruídas. só a partir daí depois é que se começa a ver outra vez a floresta. . sim, [...] tanto quanto conhece lhe permite fazer qualquer ligação desta, deste desaparecimento de vegetação com desaparecimento também de chuvas.... claro que ao retirar o coberto vegetal, eu estou imediatamente a provocar a situação do surgimento de ravinas. a água da chuva, é, são, zonas que continua a chover intensamente. essa água da chuva cai directamente no solo, desagregando esse solo e arrastando-o depois para os rios. portanto, as ravinas do Moxico, as ravinas do leste de Angola são todas provocadas pelo excesso de população que retirou ao solo o coberto vegetal que fazia a protecção física e mecânica, física, mecânica, claro, e química também, fazia a protecção desse solo. vejam, uma chu[...], se você estiver debaixo de uma árvore a apanhar chuva, a água chega a si já pulverizada, porque ela bate nas folhas, as partículas de água são, são desagregadas e portanto quando chega ao solo já vem sem força, porque houve uma f[...], uma primeira parte que amorteceu a queda da água, da, dessa gota de água, portanto quando chega ao solo já sai l[...], cai lentamente. depois disso as próprias raízes das plantas, das árvores e dos capins têm incapacidade de retenção do solo. você não consegue arranjar, arrancar um pé de capim, por mais fraquinho que seja, se não vier com um torrão de terra agarrado. quer dizer que a própria raiz da planta segrega uma determinada produto que faz uma cim[...], faz, provoca um cimento, uma agregação das partículas de terra em volta das suas raizes, até para se poder agarrar, para se proteger, senão era levada pelo vento, qualquer vento podia arrancar uma planta. portanto, toda essa acção física e química faz a protecção do solo. se você retira o coberto vege[...], vegetal, seja ele de árvores, ou de arbustos, ou de capins, não é, de... herbáceas, ou de gr[...], de gramíneas herbáceas, você está imediatamente a tirar ao solo a capacidade de defesa. essa solo já não tem mais capacidade de, de, de, de contenção e é arrastado pela água corrente.. eh, olhando para todo esse panorama ambiental, assim, é possível fazer-se qualquer coisa para evitar que esta degradação seja ainda acentuada nos próximos tempos que, já que as consequências são visivelmente graves?. nós não podemos pensar se é possível fazer. nós temos que fazer, que é diferente! nós temos que fazer! e há, desde que haja vontade das pessoas, desde que haja vontade política dos governos, tudo se pode fazer. e temos que fazer mesmo se não queremos correr o risco de desaparecermos da superfície da terra! todas as acções que nós estamos a provocar nefastas ao ambiente vão ter repercussões na nossa própria sobrevivência. ora, nós não n[...], devemos ser loucos ao ponto de querermos o nosso... próprio desaparecimento, o suicídio da espécie humana! portanto, nós temos que fazer mesmo e temos e podemos fazer! ora, como? como é que podemos fazer? podemos fazer através de vários métodos. primeiro, você tem que convencer as pessoas que, do que têm que fazer, para isso tem que os informar. ora, para isso tem que haver, primeiro estudos, tem que haver informação, tem que haver uma campanha de educação ambiental, tem que haver uma c[...], de, campanha de educação cívica, para as pessoas se poderem respeitar, tem que haver uma série de acções que levem as pessoas a compreender o porquê das coisas. após essa compreensão, você tem moral para punir aqueles que não querem fazer. eu não posso, ou não devo punir uma pessoa que não tem consciência do que está a fazer. faz as coisas porque não sabe. bem, essa pessoa deve ser alertada, deve ser admoestada, mas não punida. deve ser educada primeiro. a partir dali, a partir do momento em que ela tenha consciência de que está a faze[...], a cometer um mal, então a partir daí, nós podemos entrar com a parte coerciva, quer dizer, obrigar a pessoa a fazer desta ou daquela maneira, e há muitas formas de actuar coercivamente. portanto, há aqui já dois aspectos que têm que se, que fazer. para actuar coercivamente, você tem que ter leis, porque nós não podemos trabalhar sem leis. tem que haver leis. então, há dois aspectos importantes que é, primeiro, fazer a ed[...], a campanha de educação ambiental, alertar as populações, para que a maioria tenha consciência do que está a fazer e do que deve ser feito, como pode ser feito. segundo, ao mesmo tempo fazer publicação de leis para que logo a seguir seja possível a aplicação de acções coercivas - obrigar as pessoas a - outr[...], há muitas maneiras de acção coerciva, como disse, e depois continuar com a investigação científica para, cada vez mais, aumentar o nosso grau de conhecimentos.. também de, sobre políticas a nível de... ambientalistas africanos, eh, parece que se pensa em... sensibilizar governos, em estudar estratégias de contrapor a tanta destruição do ambiente em si. é, é possível nesta região continental fazer-se políticas concertadas entre os vários países próximos?. isso faz parte já, é uma política que já está a ser... levada a cabo. a existência da própria CADC, isto na nossa região, a própria CADC é exactamente isso. é uma tentativa dos países da própria região coordenarem-se em vários esforços entre eles também a protecção do ambiente.. 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Angola | Luanda | M | 27 | 1997 | eh, António dos Santos, você trabalha com o padre Horácio desde quando?. bom, desde, posso assim dizer, desde o início mesmo do, da, da caminhada. nós começámos pela rua, na área praticamente do Eixo Viário, quem desce para o Quinaxixe. eh, a princípio foi um pouco assim, meio difícil, não é, porque ainda não tínhamos aquela, prontos, ah, aquela força total para poder... . e... . eh... . Toni, como é que era este trabalho, vocês saíam às noites, iam ao encontro dos grupos de meninos de rua, meninas de rua, também, não é,. bom, eu praticamente, actualmente já existe meninas de rua, mas antes nós trabalhávamos só mesmo com meninos de rua. eh, nós íamos as noites, íamos às noi[...], às noites ao encontro dos, dos tais meninos. levávamos às vezes comida, cobertores e isto para fazermos a distribuição a estas tais crianças. se encontramos assim agrupados num sítio, eh, mantemos um diálogo com eles, uma sensibilização e tal, por aí, devido certos vícios que na rua também eles, estas tais crianças adquirem, não é, e, prontos. posteriormente, damos a, a... comida, ficamos um tempo com eles e voltamos para a casa. assim sucessivamente o nosso trabalho foi, eh... . vocês todas as noites tinham esse trabalho, até mais ou menos ao amanhecer?. sim, nós, eh, começávamos o trabalho, praticamente entre... dezanove e tal, até lá para as uma e tal, porque as crianças, ah, entre dezoito, dezanove e vinte é um pouco difícil de serem encontrados num sítio, porque é a hora em que eles vão à procura de, prontos, alguma, alguma coisa para comer e tal, e é entre as zero hora, duas, um[...], da uma da manhã eles estão a dormir. então ali nós acordamos estas crianças, apesar que é um pouco de sacrifício, não é, eh, e é, é incomodar a criança enquanto está a dormir, mas é aquela hora que nós achamos porque, prontos, eh, é logo, é a hora em que eles estão ali, eh, praticamente, assim, eh, reunidas. mas isto aconteceu só aqui, na, entre Eixo Viário, eh, Eixo Viário, no... Quinaxixe, no, aqui a área do banco, posteriormente nós fomos até à ilha, porque na ilha onde nós estávamos já assim aglomerados, podemos assim dizer. portanto, praticamente, lá já exis[...], estava assim como um acampamento, onde tinham, ala[...], da, assim, as crianças totalmente já bem controladas. ali o programa era diferente. já tínhamos assim a, a, a oportunidade para ter aulas de explicação, já tínhamos assim um, um, um sistema multi-educacional, posso.... esta educação era mais, eh, moral, vocês transmitiam algum conhecimento, como é que era isto?. bom, eh, nó[...], da, era tudo. moral, da, da, da, religioso, educação, assim, já académico também que era parte de aulas, eh, académicas, eh, porque, também nós já estávamos a pensar no, no futuro deles que é a, a, a... matrícula nas escolas, nas escolas oficiais, porque nós já estávamos a contar com a vinda para aqui, aqui no, no, no Palanca, não é, e prontos, então apla[...], apla[...], apla[...], apla[...], aplicávamos esta, esse sistema para tirar mais ou menos uma parte do vício que elas já, já, já tinham. porque totalmente as crianças estavam assim, bem inundadas com o vício.. e, portanto, e, con[...], conte-nos um bocado como é que era a situação dessas crianças, em que condições é que vocês encontravam, como é que elas viviam, como é que elas dormiam, alguma coisa assim mais mais.. bom, essas crianças, eh, praticamente, nós encontrávamos totalmente drogadas. drogadas com vários, já vários, vários produtos, que é a droga mesmo. a droga... são os comprimidos, então, ingeriam a gasolina, o álcool, o tabaco, que é o liamba e o cigarro, isso exclusivo, e foi um pouco assim. às vezes tínhamos... um pouco de dificuldade como contactar com essas crianças, porque nós não tínhamos assim, praticamente uma formação, uma formação para de, para, prontos, corresponder ou estar em contacto com essas crianças, mas com a ajuda de Deus, não é, tudo foi possível, nós conseguirmos, eh, contactar com essas crianças. tarde depois é quando, eh, com... os conhecimentos ou com a evolução do tempo, a UNICEF apareceu, deu-nos uma formação, prontos, um semi[...], promoveu-nos um seminário, não é, de capa[...], de capacitação, isto para, com estas crianças mesmo de rua. e ali [...] vimos o trabalho um pouco mais diferente e dali fomos... vivendo com o tempo.. e algumas dessas crianças que vocês encontravam nesse estado, em estado de droga, já estão, estão completamente recuperadas, lembra-se de alguma que está recuperada e está aqui convosco neste centro?. bom, actualmente, das que, as que encontrávamos assim totalmente drogada, uma ou duas crianças, posso me lembrar delas, está, portanto, estão, estão cá no Palanca e o restante já foram encaminhadas para a família, porque isso também é um dos nossos objectivos de, portanto, que é da instituição, promover a vida e os direitos da criança com vista à sua autonomia na sociedade e à sua reintegração na sociedade, porque nós já vimos de, devido um certo tempo, não é, as crianças já estão totalmente assim bem, eh, reintegrada, se eu posso dizer, nós vimos que, não é, eh, achamos conveniente reinseri-los para a família de, para as suas famílias. não é isso.. e, com que então, eh, também falava-se que nesta altura vocês já haviam tido algumas dificuldades, sobretudo quando protegiam as meninas de rua, falava-se das meninas de rua que muitas vezes eram assaltadas, por indivíduos, até por grupos policiais, conte-nos um bocado como é que era isto.. bom, quanto às meninas de rua, bom, a, o tempo em que nós estávamos a... ter contactos com as, com os rapazes, eh, os meninos de rua, bom, aquelas [...] eram consideradas, assim, como prostitutas, não é, posso assim dizer, eh, passe o termo. eh, nós protegíamos estas crianças devido também ao, à boa parte de caridade que nós temos, não é, o amor, não é assim, bem, bem elevado, se eu posso dizer, porque, eh, eu, aconteceu o problema do, duma menina, esqueço o nome, que foi baleada por um polícia lá no, na Mutamba, que na qual, eu e o padre Horácio é quem acompanhámos ela até ao hospital, não sei se, não acompanhei mais a, a, a, a evacuação dela da, da, da, do hospital para fora de, de an[...], de Angola, não é, porque ela foi mesmo evacuada fora de Angola, eh, mas [...] o problema foi assim, eh, uns polícias, não é, encontraram as tais miúdas a deambularem no, na, na área da Mutamba, entre o, o b[...], o, o prédio do Ministério das Finanças... é naquela área ali. então as meninas estavam assim, nos, no meio de, de alguns rapazes que são amigos dele, e prontos, a polícia estava a fazer aí a sua patrulha, [...], o seu patrulhamento e tal, prontos, e os rapazes conseguiram escapar-se e foram. e as meninas ficaram. assim que ficaram, não sei se eram mesmo polícia assim, posso assim dizer, não é, polícias, eh, nacionais, mas eles estavam fardados à polícia e levaram as meninas, forç[...], tentaram forçar as meninas para levar. uma delas é que estava... a refilar. e prontos, ainda conseguiu escapar-se das mão dos, da, da, dos polícias, ficaram-se a me[...], meteram, meteu-se a correr, e prontos, foi baleada mesmo ali. os polícias levaram as duas e foram, deixaram aí a menina. assim quando nós vínhamos do Baleizão, eh, para vir à Mutamba para estar em contacto com outras criança, encontramos a menina... a gritar. e dali, prontos, vimos pelas horas, era um pouco tarde, evacuámos a, levámos até à Quinta Avenida. . nesta altura os polícias já não estavam?. já não estavam os polícias, nessa altura. os polícias já não estavam, eh, fomo[...], levámos até à Quinta Avenida. a irmã Danuta, que é uma ma[...], uma, uma madre, que está também ligada dentro deste projecto, fez o, os primeiros socorros e, prontos, eh, passou aí a noite, no dia seguinte... levámos... para o hospital Josina Machel. houve apen[...], algumas pr[...], complicações, mas com a influência da irmã Danuta, como ela é, é médica, médica, prontos, não foi assim muito, pouco difícil rejeitarem a miúda. . e lembram-se de alguns abusos que estas crianças tenham tido e que vocês tenham sido os verdadeiros protectores, como muitas vezes se diz, abusos sexuais, sobretudo contra as tais... sobretudo meninas?. bom, eu não me lembro na, na, nenhuma, na, na, num, nenhuma acção desse tipo, porque, prontos, na altura em que nós estávamos a, a trabalhar com eles, não aconteceu assim lá tanto, tantos abusos. |
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Angola | Luanda | F | null | 1997 | quando é que se considera que em Angola passou a haver mais ou menos um grupo, ou uma elite a sair formada das escolas, nesta altura, a partir de quando mais ou menos?. bom, formada, depende do que você entende por formada, porque, escola secundária, como digo, abriu ess[...], abriu o liceu em mil novecentos e dezanove e os s[...], o seminário continua a ser uma escola secundária que serviu de formação para muita gente que, que evidentemente nunca chegou a ser padre, porque a maioria dos que frequentaram o seminário não foram padres, mas ficaram com a sua escolaridade de nível secundário. mas eu... acho que, talvez hoje já não se lembrem bem, que a primeira instituição de carácter superior, tirando uma vaga escola médico-cirúrgica do século dezanove que nunca funcionou para formar gente aqui, a primeira instituição de ensino superior foram os Estudos Gerais Universitários, que foram em mil novecentos e sessenta e três. esta colónia, ao contrário de colónias vizinhas, não teve inst[...], eh, qualquer instituição de ensino superior até mil novecentos e sessenta e três. e aí eram os Estudos Gerais Universitários de Angola, dependentes da universidade portuguesa, que em mil novecentos e sessenta e oito se converte em Universidade de Luanda, portanto para toda a colónia, tendo as suas, as suas dependências, também, eh, no Huambo e no Lubango. mas de qualquer forma convém também recordar que há certos cursos que nunca tivemos aqui no período colonial. Direito nunca houve, Arquitectura nunca houve, todos os cursos chamados de Letras não tinham licenciatura, tinham apenas nível de bacharelato. Antropologia nunca houve, Sociologia nunca houve, eh, Filosofia, se não contarmos com a opção seminário, portanto, que tem, como sabe, Filosofia e Teologia na sua formação, eh, nunca houve. quer dizer que não só foi uma universidade tardia, como limitada, e com muitas reservas desde, desde o início, e que [...], e que nunca chegou a tomar desenvolvimento pleno antes da independência, não é, e que foi feita, criada, sobretudo na altura para satisfazer a grande corrente de emigração branca que tinha aumentado muito a população de origem europeia na colónia, que começava evidentemente já a reivindicar a formação na colónia para os seus filhos. o que não quer dizer que alguns angolanos, das mais variadas origens, não tenham também apanhado já esses estudos universitários. mas, é bom termos a percepção que o ensino universitário em Angola aparece muito tarde. e estou a comparar com as outras colónias africanas, não estou a querer comparar com mais nada. portanto, quer a s[...], a escola secundária, quer o ensino universitário são relativamente tardios. é uma caracterização, infelizmente, nossa, do nosso passado, como colónia, nós e as outras colónias portuguesas, um atraso grande no domínio educacional. e os números são muito elucidativos, eh, quando se compara os números do ano setenta, setenta e três, com, por exemplo, os números de setenta e sete, percebe-se o que foi a explosão escolar pós-independência, pode-se mesmo dizer explosão escolar pós-independência, que realmente os dados mostram.. eh, quer dizer que este período vai até mais ou menos à independência, em mil novecentos e setenta e cinco. estamos a falar, mais ou menos, do nível de escolaridade nesta altura... . sim, sim. o nível de esc[...]. e a partir... . o nível de escolaridade sofre um primeiro, eu diria uma pequena explosão escolar na segunda metade da década de sessenta. efectivamente, na segunda metade da década de sessenta, portanto, a seguir a sessenta e cinco, mil novecentos e sessenta e cinco, acontecem duas coisas importantes: acaba a diferença entre a escola dos indígenas e a escola dos outros, portanto, não há mais indígenas e civilizados como estatuto e também na escola o ensino fica unificado, acabou o ensino rudimentar, ensino de adaptação, passa a haver um único ensino. depois depende das posses das famílias, de, de várias condições. portanto não há mais discriminação no ensino, a partir de, de mil novecentos e sessenta e cinco, e isto é um aspecto importante, e isso vai-se traduzir numa primeira explosão escolar, sobretudo no secundário. portanto, no primário, claro, mas também no secundário. as escolas secundárias multiplicam-se, nessa última fase colonial, e enchem-se realmente aí de angolanos de todas as origens. mas isso não chegou, isso não, essa onda não chegou nem ao ensino médio, nem ao ensino superior com muita força. a seguir à independência, portanto, até à independência, mesmo assim, e se você quiser uns números globais que sempre preocupam e assustam as pessoas, eh, acontece que ainda em setenta e dois nós tínhamos no ensino primário apenas meio milhão de alunos, e nessa altura as previsões do, dos estudos feitos, diziam que lá para setenta e nove, oitenta, devíamos ter seiscentos. eu quero lembrar que em setenta e sete, portanto ainda antes da data prevista, nós já tínhamos um milhão de estudantes nos vários níveis de ensino. portanto, e tínhamos, aliás, mais, para ser mais correcta, tínhamos, só no primeiro nível em setenta e sete, um milhão e vinte e seis mil. portanto, e depois tínhamos setenta e nove mil no segundo nível, e noutros níveis mais gente. quer dizer que realmente se pode fazar, falar numa explosão escolar no pós-independência, o que representou, é evidente, uma sobrecarga em termos organizativos, em termos de professores, em termos de, de edifícios, tudo isso. também, não estamos agora a falar de, do momento actual, poderia começar a fazer crítica do que não fizemos no pós-independência, não é, mas isto era para fazer um balanço do período colonial e eu acho que não é brilhante, não. é um balanço que mostra muito atraso, no domínio da educação. em quantidade e em qualidade.. isto... deve-se a alguns factores, quer indicar alguns?. bom, posso indicar um deles que é, é bem conhecido, o p[...], a própria metrópole que nos colonizou tinha um índice de analfabetismo ainda substancialmente alto no século vinte em relação a outros países europeus. eh, por outro lado, o regime que se instala em Portugal a partir do anos trinta, o regime fascista, o regime de Salazar, é um regime bastante retrógrado no domínio científico e é um regime pouco interessado em alargar muito os horizontes e o conhecimento das populações, a não ser na medida em que precisava de formar as pessoas para o trabalho, não é, portanto, escolas politécnicas, escolas técnicas, etc. então, mesmo as universidades portuguesas se ressentiam disso. quando eu disse há pouco que nós não tínhamos certos cursos, eu como estudante fui para Portugal em sessenta e nove fazer História e, e não podia, por exemplo, ir fazer Sociologia, se eu quisesse. não havia um curso de Sociologia em Portugal. a não ser uma coisa ligada aos estudos de política ultramarina para formar funcionários para o ultramar. não havia um curso de Antropologia, como tal, a não ser ligado à política ultramarina para formar funcionários para o ultramar. eh, estou a usar a linguagem da época, claro. eh, e havia, portanto, mesmo nas universidades portuguesas, no domínio das Ciências Sociais, não direi no domínio da Medicina e da Engenharia, onde havia um certo desenvolvimento, mas no domínio das Ciências Sociais um grande atraso, que o próprio regime português criou. quer dizer, colonizado por um país, que já em si tem atraso no domínio educacional, a colónia certamente não vai ter mais desenvolvimento que a metrópole, hum, isso é um aspecto. o outro é que é bom lembrar que Angola só foi totalmente ocupada já neste século, portanto a colónia com estas fronteiras que nós hoje conhecemos como país desenha-se no século vinte. . e voltando um bocadinho no tempo e no espaço, eh, como é que começam a aparecer então, para além da, daqueles casos isolados que já disse, os primeiros doutores, ou aqueles que aparecendo, talvez fossem os assimilados daquela altura, com um nível mais ou menos equiparado ao doutoramento? há casos isolados, como é que se explica estas, bom, estes que aparecem?. doutores sempre teve muito poucos. eu, eu, eu acho que hoje em dia, com a proliferação de doutores que a gente tem, eh, tende a projectar para o passado esses nossos, essas nossas maneiras de observar. doutores sempre houve muito poucos. eh, mesmo falando licenciados, já não estou a dar esse desconto, que aqui s[...], chamamos doutor a qualquer licenciado, mas, mesmo licenciados houve muito poucos, para as próprias necessidades da colónia. isso era uma, uma reclamação feita, quer pelos filhos de colonos quer pelos filhos dos colonizados, era uma, uma, um protesto, uma reclamação sempre sentida. a questão dos, entre aspas, civilizados, ou entre aspas, assimilados, é outra questão, isso não tem que ser doutor, é uma questão de ter adoptado, incorporado e aplicar um modo de vida mais, eh, próximo das influências culturais europeias, e isso sempre houve ao longo da história de Angola, grupos e camadas sociais, uns mais letrados, outros iletrados mas adoptando certos usos e costumes, isso sempre teve ao longo da história de Angola, e depois, agora, seria preciso analisar em cada período o que é que isso significou. |
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Angola | Luanda | M | 22 | 1997 | vamos à conversa com o jovem Gaspar, com... um jovem de vinte e dois anos que em Luanda como outros jovens tem uma situação particular. muito cedo abandonou os familiares, por situações que ele próprio vai explicar. . por isso é que vamos saber também se trabalha.. sim, trabalho, não é, e é do meu trabalho que eu consigo sobreviver. . é. o salário satisfaz?. sim, sim. de facto. satisfaz.. podemos saber quanto é que ganha?. duzentos dólar, vamos assim dizer.. e com duzentos dólares é possível fazer-se frente a tudo, eh, à vida, ao custo, e... como é possível sair-se desta situação, assim, sem grandes problema?. bem, primeiro, é que eu vivo só, não é, vivo só, e, portanto, com... os duzentos dólares que eu ganho eu consigo, pelo menos, eh, fazer as minhas compras e comer, não é, durante o, o, o mês todo. durante trinta dias.. é só porque vive só é que esta facilidade lhe está, é porque, é só porque vive só é que tem esta facilidade?. sim, sim. é porque tenho essa facilidade. porque se fosse, se eu vivesse com mais alguém acho que esse dinheiro, di[...], dinheiro não chegava. nem para mim, nem para a pessoa com quem eu vivesse e para o meu filho.. [...] também falando um bocadinho das condições sociais, o Gaspar, por exemplo, tem à sua disposição um meio como um televisor, um, as suas condições, eh, em casa, tem meios que, que lhe sirvam para dizer que leva uma vida regular.... bem, em casa eu não tenho meios. eu não tenho esses meios, em casa.. portanto, eh, conte-nos um bocadinho a sua experiência desde sair da família e viver sozinho e mais ou menos equiparado aos outros jovens da r[...], de Angola. . bem, eu vou mesmo começar pela, pela minha família, não é, eu saí de casa, d[...], aos treze anos e portanto comecei a dormir f[...], em casa dos amigos, não é, hoje dormia em casa de um, amanhã de outro, amanhã comia ali e assim sucessivamente, não é, inclusivamente, até fui parar a um sítio que, mesmo aí próximo do Marçal, não é, perante uns amigos bandidos que roubavam e fumavam liamba, roubavam as suas coisas e metiam ali, não é, então eu vi, v[...], verifiquei que ali não era o sítio ideal para mim, não é, então fui trabalhando normalmente, primeiro fui trabalhar numa serra[...], serralharia, não é, e onde fiquei aí duas semanas e depois tive de sair dali e fui para a Feira N'Goma, não é, que é lá quando comecei a minha experiência de hotelaria e três meses depois fiz o curso de hotelaria, aprovei, não é, como um dos melhores empregados, e fui para o, o Afrodisíaco funcionar como empregado de mesa e depois passei para o Farol Velho durante cinco meses e agora continuo no, no Imoca, não é, a trabalhar, normalmente.. e, Gaspar, porquê então ter-se afastado da família, algum motivo, e assim tão cedo? eh, será, terá havido alguma razão?. exacto. há razões sim. porque, primeiro é que eu tive problemas mesmo com a família. sim tive problemas com a minha família, não é, e portanto a minha mãe faleceu muito cedo e de. eh, então depois de ter perdido a mãe, o que é que se deu?. sim, não é, a minha mãe era uma pessoa que teve muitos problemas com, com a mãe dela, não é, e depois dela ter morta, parece que o sofrimento dela toda recaiu sobre nós, não é, a família parece que não queria responsabilizar-se de nós, porque nós somos três, então, estávamos separadas, não é, uma estava num tio, outra estava numa prima e outra, e outro estava na avó que sou eu. só que esta avó, portanto, não sei se ela gostou da minha pessoa ou não gostou, maltratava-me muito. então foi a razão no qual eu tive de sair mesmo da minha família e arranjar um cantinho que é para mim poder viver sozinho trabalhar normalmente, para mim poder sobreviver. . eh, nesta altura, quantos anos tinha?. bem, treze, treze anos, nessa altura.. e aos treze anos lembra-se de algum drama, eh, como é que eram as noites, a sua sobrevivência e como é que conseguiu até hoje manter-se?. bem, eh, naquel[...], na[...], naquele tempo, portanto, como eu já antes tivera dito, não é, eu dormia hoje aqui, amanhã ali, às vezes, eh, portanto, dormia mesmo na rua assim ao ar livre. e mais tarde eu verifiquei que estava, estava, estava mesmo a caminhar muito mal, não é, estava que nem um menino de rua e no entanto eu tive de fazer o esforço, poder trabalhar um bocadinho para ver se conseguisse um tecto para mim, não é, e até que eu consegui um tecto para mim viver.. e hoje o Gaspar vive, eu já visitei a sua casa e conheço mais ou menos e como é que conseguiu então encontrar um espaço?. bem, na altura, eu estava a trabalhar com um branco. esse branco confiou tanto em mim que, e, que disse que eu tinha que trabalhar ao lado, ao lado dele, eu tinha que ir viver ao lado, ao lado da casa dele. no entanto ele mandou-me procurar um quarto, e como eu já tinha quatrocentos dólares em casa, então estava a andar com um amigo e este amigo começou a procurar o quarto para mim durante três meses. e nós conseguimos um quarto mesmo na Mutamba. [...]. e qual é a sua maior aspiração depois de ter conseguido ultrapassar com muitas dificuldades ao, ah, de ter-se triunfado na vida, digamos assim, com algumas dificuldades, qual é a maior aspiração para o futuro que pensa realizar?. bem, a minha aspiração nesse momento seria mesmo trabalhar na informação, porque eu... tenho o, o segundo ano de jornalismo, não é, apesar de não ter terminado, faltavam dois, e portanto, eu me esforço um bocadinho que é para ver se entro, portanto, na Rádio Luanda, ou em qualquer emissora que é para mim poder aprofundar um bocadinho a minha experiência, porque eu sei na realidade que, acho que a minha, minha vocação seria mesmo rádio.. é, portanto com esta vocação, eh, pensa encontrar talvez algum caminho para... tirar ou para compensar alguma coisa que no fufu[...], no passado não teve, ou pensa com isto ajudar algumas pessoas que tenham experiência parecida à sua?. não, ajudar, para as poder ajudar algumas, algumas pessoas que têm que, portanto, praticamente estão na minha situação, não é,. de que maneira, mais ou menos?. eh, portanto, eh, eu, da forma em que eu vivi, não é, já estando num, num, portanto, num órgão assim de informação, eu poderei comentar a minha vida a muitos daqueles que também vive a me[...], a mesma situação. portanto, eu não roubei, não é, e eu espero que muitos jovens também não roubam ao, ao, portanto, ao quererem recomeçar a vida, não é, então, é essa a mensagem que eu pretendi e pretendo, pelo menos ainda, dar a conhecer às pessoas, não é,. e Gaspar falou-nos um pouco de, da morte de sua mãe, não nos falou do pai, e em que situações é que isto aconteceu. conte-nos um bocadinho da sua situação familiar quando estava com o pai e mãe, como é que foi?. bem, quando eu era mais pequeno, mais pequeno ainda, digo mesmo, eh, eh, a, a, o pai e a mãe t[...], também tiveram muitos problemas, que eu ainda recordo uma luta de minha mãe e de meu pai. e d[...], após a morte, portanto, o meu pai separou-nos e eu estou, há quase vinte anos que não vejo o meu pai, e nem sei onde está nesse momento.. lembra-se de algum motivo, terá, terá sido alguma pessoa que bebia muito ou, não, não tem mais ou menos ideia de como era o pai, a figura que marca que tem?. bem, o meu pai é uma pessoa que bebia muito, de facto. bebia e depois até fazia confusão. eh, recordo-me, uma das vezes, ele bebeu e foi lá para casa de, de, dos meus avós e... levou assim umas coisinhas para mim: calções, um par de, um par de sapato e, desde aquela data até hoje, eu hoje não consigo ver o meu pai, e eu tenho certeza absoluta que se eu o ver na rua ainda posso esquecer dele.. eh, que receptividade é que você tem com a família, com a, a que esteve ligado, e que de uma certa maneira você tem reservas muito negativas?. bem, nesse momento eu não ligo à minha família. eu não estou, não, não, não, não, não dou assim mui[...], muito, muito bem com a minha família, não é, embora, embora eles me tirarem do sítio onde estava, porque eu estava mesmo muito doente. mesmo já em minha casa estava muito doente. e, portanto, foi a família que me pegou e levou-me ao hospital, fiquei três meses lá, então, eu também devo agradecer a essas pessoas. mas há outras f[...], há outros familiares que nem sequer queriam botar a mão em cima de mim. essas pessoas irão pagar um dia.. eh, irão pagar de que maneira? não pensa numa reconciliação, ou pensa retaliar pela mesma moeda?. bem, reconciliação, hum! reconciliação eu não digo, não é, porque até agora abandalham-me. até agora abandalham-me. prontos, também não vou sujar as minhas mãos de sangue, não é, mas irei utilizar uma vingança límpida, chamo assim. |
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Angola | Angola | M | null | 1997 | então Domingos, vamos ao conto, que parece gira em volta de que temática mais ou menos? . da prudência que devemos ter na justiça, não é,. portanto, a prudência que se deve ter na justiça, muitas vezes os contos africanos, sobretudo aqueles originários, têm em cada um a sua mensagem. então vamos a mais um, em que o Domingos vai contar. faz favor.. em determinada aldeia, existia uma família que teve um filho deficiente, na perna. essa família foi procurar o médico tradicional, que é o curandeiro, e a partir daí o, a receita que o curandeiro deu é a de... que o filho, que tinha a perna deficiente, usasse uma pulseira, para quando, ou, cada vez que olhasse na pulseira, a tendência seria de melhorar. aconteceu que essa família, no seio desta família, não havia ninguém que possuía a pulseira recomendada pelo... médico tradicional. foi então que... a[...], ocorreram a outras famílias e apareceu uma que tinha essa pulseira, e emprestaram a pulseira, e aí a criança começou a usar e cada vez que olhava, cada vez que andasse, procurava melhorar, e até chegar a melhorar, a pulseira permaneceu. os anos passaram, a criança cresceu, e até que atingiu mais ou menos dois anos, a outra família, foi a, a família que havia emprestado a pulseira, foi buscar a pulseira. quando lembraram-se, já a criança estava grande, forte, e não dava para tirar a pulseira da perna da criança. e ninguém daquela família tinha uma pulseira idêntica para devolver. . portanto uma pulseira com poderes mágicos, não é,. eh, podemos assim dizer, sim.. e muitas vezes na tradição africana, as pessoas usam mesmo, eh, pulseiras, e porque realmente acreditam em qualquer coisa de mágica. quando se vê, muitas vezes, muitas mulheres africanas, sobretudo quando a gente viaja um pouco mais para o interior, a gente vê pulseiras justamente, era mesmo, eh, algumas delas têm qualquer coisa a ver com a tradição.. segundo o que se diz, pelo menos pelos muílas, onde eu andei muito pouco tempo, não é, quer dizer, conheci um pouquinho aí, mas, diz-se que as pulseira têm um poder energético, eh, muito forte, assim para, e que dá resistência às pessoas.. é, com que então vamos retomar o conto. a criança cresceu com a pulseira e a família veio a pedir, a família que tinha emprestado a pulseira.. exactamente. então, como ninguém da família que... tinha o filho deficiente anteriormente, nem, nem deles tinha a pulseira, e a outra família exigia a ferro e fogo que tinham de, de devolver a pulseira, então a solução foi única. cortar a perna da criança para tirar a pulseira. e fizeram. hum, d[...], cortaram a perna da criança e... entreg[...], devolveram a pulseira. passado alguns tempos, aquela família que era possessa da pulseira, teve um filho, nasceu uma criança, que nasceu com os olhos tortos, e foram ao curandeiro, um médico tradicional e este disse 'olha, a criança deve usar um colar, no, no peito, no pescoço', para cada vez que olhasse para este colar, eh, ela, para [...], para cada vez que olhasse para este colar, ela... tendia a melhorar, a endireitar os olhos. então aconteceu que a criança, a de, a outra família teve de recorrer ao, à mesma família que anteriormente lhes havia emprestado a pulseira. então emprestaram o colar e a criança começou a usar, até melhorar... os olhos. passaram-se anos, a crian[...], a jovem, a criança que depois f[...], tornou-se jovem, eh, ficou forte, já ninguém mais lembrava e a outra família foi então buscar a, o colar que havia emprestado. foi assim que chegado lá, ninguém da família tinha o colar idêntico para emprestar. e não havia forma de tirar o colar do pescoço daquela jovem. então, nou[...], a outra família exigia que tivesse que devolver o colar, a ferro e fogo, tal como aconteceu com a pulseira anterior. então não tinham outra, outra alternativa senão cortar a cabeça da... jovem para devolver a pulseira e termina por aí o conto, não é,. portanto, um conto em que, por duas ocasiões, a menina teve que devolver primeiro a pulseira e depois devolver também o colar que custou o pescoço, no caso de, do colar e a, bom, a perna no caso da, da pulseira. portanto, uma mensagem que fica em volta disso. eh, como é que se interpreta este conto?. eh, é que nós temos que ter prudência ao fazer a justiça, não é, quando queremos fazer a justiça para com alguém que nos deve, ou para com alguém que n[...], ou que nos fez algum mal, eh, temos que medir bem o que nós queremos fazer e as con[...], e prever, procurar prever um pouquinho as consequências daquilo que... a gente vai fazer, não é, porque muitas vezes nós agimos por sentimentalismos, emoção a mais, e às vezes não... damos conta que ferimos muitas sensibilidades, não é. |
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Brasil | Rio de Janeiro | F | 30 | 1972 | uma fazenda é, fica em Friburgo, vinte minutos depois de Friburgo, portanto no município de Friburgo. a fazenda é bem grande, tem uma casa tipo colonial. a casa é toda cercada por um varandão com, com... cerquinha de madeira e depois então dentro tem uma sala muito grande, com duas portas em que se abrem duas alas, que são duas alas de quartos diferentes, cada ala com o seu banheiro... servindo. depois tem uma porta bem grande de ferro que separa da copa. a copa não é absolutamente como nós vemos na cidade. a copa é uma sa[...], uma sala de jantar. aquelas mesas enormes, cadeiras enormes, pronta a receber uma família com muitos filhos. a cozinha - logo em seguida vem a cozinha - também muito grande, uma coisa maravilhosa que aqui na cidade não se vê, que é fogão a lenha. você já viu fogão de lenha? é espectacular, não é,. é [...]. e esse fogão da fazenda é uma maravilha, conservado por uma empregada antiquíssima. então, o grande... prazer dela é depois que termina toda função de alimentação e de alimentar aqueles vândalos, de... arear os metais, passar brasso, então o fogão fica lindo, maravilhoso. aí chega na hora do jantar, bota lenha fica tudo pretinho outra vez. não tem importância.. [...]. todo dia ela faz a mesma coisa. bom, tirando, da cozinha, nós temos o pátio bem grande. nesse pátio tem uma reserva de lenha, a parte fechada, tem uma escadaria de pedra, em cima tem um morro e nesse morro tem uma pequena cabana que foi feita para as minhas filhas. é uma cabaninha de boneca. então, nessa cabana de boneca tem uma reprodução do fogão de lenha da fazenda.... hum.. sem os dourados. isto é muito importante. logo a seguir depois tem uma outra casa, que é a continuação da fazenda. então, na parte de - dois andares - na parte de baixo tem uma sala grande, que está vazia actualmente, mas que futuramente seria uma sala de jogos.... hum.. jogo-de-botão, pingue-pongue, etc., etc. e em cima tem três quartos, esses três quartos estão mobiliados com uma mobília idêntica à que eu tenho no meu quarto, e... tem um banheiro, um banheiro e uma sala. aí normalmente ficam os rapazes da casa, totalmente isolados. agora, bem longe da casa, dessa fazenda, mas dentro ainda do, do território familiar, tem uma piscina, piscina natural. aliás, a piscina até é muito interessante, descobriram esse ano que esta piscina foi escavada cem anos atrás. fizeram, sabe, porque o, a piscina furou, o fund[...] - não sei se tem interesse.... tem, tem.. [...] não, claro, todo o interesse.. o fundo da piscina deu defeito, tiveram que esvaziar e pi[...], e pintar, e limpar. aí perceberam que estava toda quebrada, então resolveram tirar - porque a piscina natural é toda de pedra - então resolveram tirar aquelas pedras e botar um cimento. quando começaram a, a tirar a parte, a parte externa, começaram a perceber que tinham mais pedras para dentro, todas, eh, manuseadas.. hum, hum.. um negócio assim engraçado, não é, aí começaram, meus tios ficaram assim meio curiosos e chamaram pessoas interessadas e pessoas que entendem disso, então começaram a dizer que realmente al[...], muito tempo atrás, não foram definidos, tiraram amostras de pedras, não sei mais o quê, para saber há quanto tempo que realmente aquela piscina tinha sido, sido cavada, não é, engraçado. e agora está lá como relíquia histórica. não sabemos o que vamos fazer da bendita da piscina, não é, todo mundo sem coragem de cobrir... a parte antiga. um negócio assim espectacular.... você disse que tem uma piscina de água natural, quer dizer, a, a água vem de, de onde?. a água vem de um rio.... hum.. e... s[...], ela é represada num pequeno lugar. e este lugar justamente, quando os tios mandaram fazer, eles acharam que seria um lugar ideal porque alargava ligeiramente, quer dizer, o rio dava uma lá[...], um alargamento, tinha uma ligeira queda. então acharam engraçado que realmente parecia que estava formado aquilo ali, mas formado com terra dentro e mato, etc., etc. então eles represaram o rio, fecharam, mandaram cavar, mandaram limpar e conservaram as pedras naturais... e abriram o ri[...], o rio formou o poço, o poço depois cai e faz uma outra cachoeira e é um lugar maravilhoso.. a água é tratada? . não, a água não é tratada. a água é limpinha de rio sem.... que corre.... é. rio sem casebres para cima, a nascente... não tem problema. que mais que vocês querem...?. bom, e, e a casa fica por exemplo, assim, é presa a outra casa da fazenda ou ela é solta? como é que é? . não, a casa é bem, vamos ver, se nós, nós não temos o problema da cidade de, de ficar devassado absolutamente. agora, temos vizinho pertos. o lot[...], o terreno da fazenda era muito grande, então foi loteado uma parte. então, você tem pessoas perto, sim, na base de cinquenta metros de distância, cem metros. você não fica inteiramente isolado, mas a casa é, não é devassada absolutamente. nós não temos vizinhos próximos, ou muito próximos.... a casa fica assim no centro do terreno?. fica no centro dum terreno alto. quer dizer, ela de cima, ela fica, ela pode ver todo o resto da fazenda, certo,. o que é que tem no resto da fazenda?. ah! o resto da fazenda. no resto da fazenda você tem, perto da piscina, você tem uma outra casa bem grande, que era a fazenda antiga. seria a sede da fazenda antiga, certo, mas essa sede actualmente é tida como mal-assombrada. então, apesar de sermos todos pessoas esclarecidas, nós não temos muita vontade de ficar nela. isso é evidente.. vocês nunca entraram lá?. a gente entra, a gente faz aposta, sabe, de passar tempo lá, etc., etc. você sabe, todo mundo tem filho, então chega assim sete ho[...], horas da noite, oito horas, tem que dar jantar apesar de ter babá. então, você sai da fazenda para ficar supervisionando, essas coisas assim que absolutamente não te afectam muito.... está vazia a casa? não tem nada no lugar?. inteiramente vazia. nada.. é muito grande ela?. enorme.. e do mesmo jeito, o mesmo, a mesma construção que a.... é muito mais bonita porque é muito mais antiga. ela deve ser, está-se presumindo que essa casa já foi, nós encontrámos, quer dizer, nós não, meus tios encontraram com, quando compraram a fazenda já tinha essa casa. aí mandaram construir essa que nós moramos, quer dizer, é recente, é moderna. esta outra casa presume-se agora que seja do tempo em que.... eh, da piscina.. da piscina. agora, correm sobre ela milhões de lendas, não é, de que andam.... porquê? qual lenda? o que é que dizem?. dizem que foi um, um lugar, uma sen[...], tinha uma senzala, tem realmente uma, uma parte subterrânea em que poderia ser uma senzala de escravos, entende, então parece que houve histórias de que houve fugas de escravos etc., etc., durante o período da, do século passado. então que os escravos ali se refugiaram, mas que descobriram e fizeram morticínio. então que os escravos, as almas dos escravos clamam por vingança, etc., etc.. aí [...] ficar com medo, não é, [...]. exacto. e que só atacam, só atacariam, quer dizer, as almas atacariam, os fantasmas, sei lá quem, atacariam os brancos, principalmente sendo donos de terra. [...]. como você vê não é muito interessante. eu mesma levei um susto agora esse fim de, esse fi[...] - estou fugindo do meu problema de casa, não é, . não, não, não está não, pode falar à vontade.. nós levámos um susto tremendo essa, agora em Julho. normalmente eu sempre, a gente sempre conta as bravatas, que você não tem medo disso, que você não tem medo daquilo. imagine, alma do outro mundo, boba[...], bobagem. então eu falei para as minhas crianças que absolutamente não acreditassem nessas histórias porque... isso era coisa de gente ignorante e as pessoas da fazenda não, não, não vinham à cidade, não tinham meios de comunicação, etc., etc. então, eram pessoas burrinhas, pobrezinhas, coitadinhas, então que não tinham a menor possibilidade, que cabia a nós, como pessoas esclarecidas, ensiná-las e mostrar as coisas como deveriam ser. elas, como meninas da cidade, aquela lengalenga toda, não é, então uma noite nós fomos ao chiqueiro que fica perto dessa fazenda e escureceu muito rapidamente porque estava ameaçando chuva. então o negócio era o seguinte: 'nós não vamos passar perto da casa velha'. 'sim, nós vamos passar perto da casa velha. absolutamente não tem perigo'. 'está bom'. e foi aquela coisa, pilha de crianças, sete crianças, eu e mais duas moças, 'vamos passar em frente da casa velha'. passámos. aí, 'vamos entrar?' 'vamos entrar'. e entrámos. as crianças... apavoradas, mas ninguém com coragem de demonstrar, nós não tínhamos nada. bom, começou realmente a chover porque estava ameaçando a chover, um vento, sabe dessas coisas de cinema, aquele 'Morro dos Ventos Uivantes'? o vento batendo, as janelas batendo, aquela coisa toda. aí nós ficamos meio assim, 'vamos esperar passar a chuva, não sei mais o quê'. 'está bom'. aí sentamos no chão, ficamos contando história para as crianças, brincando. de repente, nós escutamos um barulho, mas uma coisa assim, nós nos olhamos, nos entreolhamos e fo[...], 'alguém tem que saber o que é que está havendo, não é, porque o barulho não é normal'. aí fomos ver, as três juntas de mão dadas, pálidas, brancas, só faltava os cabelos estarem eriçados, disfarçando para as crianças. dois cavalos entraram dentro da casa e começaram a, a ficar, eles ficaram desesperados. estavam presos, não é, mas faziam um barulho ensurdecedor. mas não foi nada de mais, não. mas que deu susto, deu! |
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Brasil | Rio de Janeiro | F | null | Década de 80 | e quem cozinha, você ou seu marido? . eu que cozinho mesmo. ele não sabe fazer nada, sabe nem fritar um ovo!. sabe fazer café. . só! só café! às vezes o outro, o caçula é que fala 'pai, vamos fritar' quando eu não estou aí, que eu saio às vezes lá fora, não é,. hum, hum.. também tem, preciso, não é, ir na rua, 'pai, pode deixar que eu frito o ovo para o senhor.' aí ele frita.. ham, ham. . ele só come dois, três, . sei.. não come menos que dois, três, o garoto. poxa, é muito ovo, heim? . é. e no pão, ele gosta fritar ovo, botar no pão, tanto eu não fico sem ovos. todo Domingo é duas, duas dúzia de ovos que eu compro . sei.. na feira. ou na Cobal.. então, se, se você cozinha deve ter um prato que é o predilecto dos seus filhos. qual é? . ah! do meus filho é, do caçula é carne assada. . ham.. adora carne assada. boto linguiça e boto toucinho de fumeiro, não é, assim por, ele adora! ele catuca e tira aquelas, aquelas, aquelas linguiça toda de dentro. eu não aguento com ele. ele é engraçado mesmo. e o mais velho gosta de galinha. . é? . já meu marido adora macarrão. . ham.. adora ma[...], quando eu faço macarronada.. conta para gente como você faz a sua carne assada. dá a receita para mim.. ah! eu to[...], eu faço só de patinho.. sei.. eu compro um peso bom de patinho, redondo, não é,. hum, hum.. e ali eu meto o facão assim por dentro, boto um, pego um paio e coloco assim por dentro, do outro lado eu boto um pedaço de toucinho fumeiro. hum, hum.. aí, ponho para o fogo para assar, com bastante óleo, não é,. sim.. bo[...], ah, diminui o fogo, não boto nem um pinguinho de água. . hum.. deixo ali, vai, vai cozendo, assando devagarzinho, devagarzinho, depois vai corando, aí eu boto umas cebola descascada. sei.. pimentão, umas batatinhas pe[...], miudinha, não é,. hum, que delícia.. aquelas batatinha, ponho, ainda fica, é assim que eu faço. aí fica bem corado . hum, hum.. e ela fica bonita, gostosa! . hum!. mas não coloco a carne cara, nem esse lagarto, eu não gosto. porque é muito dura. hum, hum.. é uma carne muito ressecada e tem que estar pondo água.. sei.. eu não gosto [...] de assar botando a água.. hum, hum.. eu a[...], vou assando assim só com aquele calorzinho dela, só, fica uma delícia. . hum! deve ficar uma delícia.. é. . é. e o macarrão, como faz? . o macarrão, eu faço com bastante carne. compra-se um pedaço de boi, não é, . hum, hum.. aí faço, assim, bastante molho. aí vou botando macarrão e a carne, o macarrão e a carne, vou jogando por cima. . hum!. depois eu encho de queijo, aquela carne assim por cima. marido adora! . a próxima vez eu venho almoçar. . pode vir. |
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Brasil | Rio de Janeiro | F | 44 | Década de 80 | escuta você estava falando para mim que conhece Minas, não é, . conheço, e gostei muito, porque eu tinha uma vontade muito grande de ir lá.. hum.. o ano passado, quando t[...], aproveitou-se um congresso de médico que não se foi, aí, em vez de nós irmos ao congresso, no meio do caminho eu disse 'vamos a Minas.' aí, lá fomos nós para Ouro Preto, Mariana e aquilo tudo. depois fomos a São João del Rei e Tiradentes. é o que eu te disse que adorei, mas adorei! porque eu gosto muito de coisa antiga, sabe,. sei. . a minha família, como toda família de Pernambuco, tem uma mania de coisas antigas, de casa, de móvel, meu pai foi fazendeiro, então, tem essa história toda aí, eu gosto muito, sabe, e eu achei, mas eu achei uma be[...], adorei! . hum, hum.. adorei. achei a melhor coisa que eu fiz assim em termos de viagem, assim de coisa pi[...], nada de excepcional, mas eu acho uma beleza. e depois assim aquele contraste muito grande, não é, entre as, as igrejas, e tudo do lado de fora tem aquela simplicidade, quando você entra é aquela, aquele, coisa de uma ostensividade, não é, . sem dúvida.. é, do, do luxo, do, do, do ouro, do dourado e além disso aquela coisa toda, que também tem as pinturas, os coloridos. eu acho aqueles coloridos, assim, da maior exuberância, não é, que aquilo tudo fica, é muito, é muito brasileiro, não é, quer dizer, é muito português, é, mas é muito nosso também, então.... sem dúvida. é muito da nossa história ali dentro, não é,. ah! achei, achei uma, adorei! agora, eu sou louca para conhecer Olinda. . ah é? . é que eu não conheço o norte. eu tenho maior vontade!. os pais pernambucanos, mas você nunca foi?. nunca fui a Pernambuco. não, não s[...], meus pais não, mas meus avós.. é os avós.. a minha família toda é pernambucana. é. . hum, hum.. e eu nunca fui. mas eu tenho uma vontade muito grande de conhecer. Olinda! ir a Maranhão, a São Luís, isso tudo. mas eu não sei, eu achei Minas uma maravilha. e depois, também por causa da diferença, sabe, eu acho que é muito diferente para quem viveu a vida inteira em termo de Rio de Janeiro, você sair daqui e pegar um lugar assim, assim, cinza, como eu estou te dizendo, com aquelas montanhas assim... . ham, ham. . aí dá en[...], para entender mais o jeitão do mineiro, não é,. o que é que você acha que é o jeitão do mineiro, Heloiza? . eu acho, sabe, que tem aquele de[...], assim, aquela coisa assim, aquela coisa sóbria, sabe, aquela coisa. hum.. sóbria que o mineiro tem, que não é tão exuberante feito nós somos, mas tem aquele ar assim, assim ma[...], fechado, sabe, que não tem a água, em termos de mar, assim, a coisa da abertura, dá aquela coisa, assim, mais introspectiva... . sei. . é, eu acho que ele tem, tem todo o astral em volta para dar aquela certa concentração. . ham, ham. . sabe, . é, é tudo entre montanhas, não é,. é. e tem um vento, é uma coisa incrível, eu fiquei impressionada, parecia que você estava dentro de um navio, em Ouro Preto. porque venta tanto, não é, você tem a sensação que você está num navio, sem ter água!. correcto!. eu gostei.. você chegou a conhecer em Tiradentes aquela, aquela igreja de Santo António? aquela matriz de Santo António... . que coisa maravilhosa! aquela que tem, que tem o órgão?. que tem o órgão, o primeiro órgão. . ah, mas é linda, das mais lindas que eu achei! achei das mais lindas. . é considerada a segunda em riqueza, não é, . ai, achei lindíssima! linda! Tiradentes é um, realmente encantador. achei lindo! depois as pessoas de lá são tão agradáveis, as pessoas do lugar, não é, então, sabe, você faz uma perguntinha qualquer, e eles são tão simpáticos, assim, achei óptimo! óptimo. e depois, teve uma coisa, porque eu achei Ouro Preto, Mariana, aquilo tudo a[...], por ali, eu achei sujo. hum.. muito sujo. agora, em Tiradentes não! é limpo! é, é, é limpo, sabe como é, eu acho que já é, é, é mais, eu achei uma gracinha! muito pequenininho, tudo isso, mas achei uma gracinha, porque é limpo. e eu não sei se é porque tem mais verde, não é, parece um presépio, eu achei lindo. . você não teve assim aquela sensação de, ao entrar assim, como que estar fazendo uma volta ao passado, dentro daquela cidade? . ai, não! não era questão de volta ao passado. eu achei que era um lugar que eu já conhe[...], não era nem que conhecia. é um negócio que faz parte de mim, está entendendo? . hum.. é assim, era uma coisa assim que me dava a sensação de 'é, isso eu já conheço!' dá, sabe, assim, já conheço no sentido, mas um conheço gostoso. não é aquele conheço, assim, chato, já conheço chato. . sei.. um já conheço assim, é uma coisa que faz parte da, da minha herança, da minha vida, de tudo que eu gosto.. Heloísa, você sentiu assim que tanto em Tiradentes, São João del Rei, todas essas cidades, muita coisa que é realmente histórica e está assim muito abandonada.... abandonada? mas eu acho que tud[...], dá, dá, dá uma sensação. em Ouro Preto, então, é muito, não é, é muito. agora, vou te dizer um negócio, mas ao mesmo tempo, eu acho que está havendo uma preocupação maior, não é, no sentido de preservar o que é da gente, não é, porque você vê, aqui perto tem uma cidadezinha, chamada Bananal, que fica perto de Barra Mansa. . não conheço. . é uma cidade que também tem muito coisas antigas. mas é uma tristeza, as pessoas do lugar não dão o menor valor, sabe, por exemplo, eles acham que coisa antiga é coisa velha. então botam para, arrebentam com o negócio, acham lindo fazer uma casa assim género planalto, é, palácio da alvorada.... sei.. assim, sabe, no meio, uma coisa assim... . ham, ham. . tacar ladrilho nas casas que não têm nada a ver. mas eu acho que, pelo menos eu acho que, que lá já está havendo mais, dentro do povo mesmo, da gente do lugar, uma consciência maior do que aqui, o velho não é, o, quer dizer, o antigo não é velho. . correcto.. eu acho que tem uma preocupação maior. mas acho que, aí é que eu acho. eu acho que é uma questão de educação, não é, e acho que isso, que o governo tem muita responsabilidade nisso. tem que ter. no sentido, sabe, eu acho que, por exemplo, deveria usar a televisão para se fazer propaganda, para se preservar, para se educar, para mostrar que a, que antigo não é velho!. correcto.. sabe, eu acho que é uma questão de educação. . nesse ponto aí, você concorda então com essa, a, essa, toda essa campanha que o, a Fundação Roberto Marinho vem fazendo e [...]. ah concordo! claro! mas não interessa. eu acho que, contanto, sabe, que as coisas sejam preservadas e, e der uma consciência maior em termos de povo, de educação, eu acho que é o mais importante, sabe, porque eu acho que todas essas, eh, televisão e essas companhias particulares, as pessoas que têm o dinheiro na mão, tinham mais é que se preocupar com essas coisas mesmo. no sentido de uma educação, não é,. correcto. sem dúvida.. de uma educação, porque eu acho que é, o maior problema da gente é educação. tudo vem em decorrência dele.. hum. |
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Brasil | Rio de Janeiro | M | 62 | Década de 80 | como essa palavra que muita gente ouve nordestino chamar de 'bichinho'. . bichinho. . é uma palavra carinhosa. . hum, hum.. a pessoa chama de bichinho a outro, [...] pessoa, a pessoa gosta. como um pai chama um filho, um filho chama a mãe, pode chamar a mãe de bichinho: 'ó bichinho...' é uma palavra de carinho, não é uma palavra de ofensa. hum, hum.. não é, não é uma palavra ofensiva, bichinho. então, o, deu-se uma coisa muito interessante: eu fui em setenta e sete à Paraíba, a João Pessoa, mas eu lá tive que ir a Guarabira. fui levar umas encomendas, um rapaz que me pediu. fui lá em Guarabira levar. fui eu e aqui minha patroa. . hum, hum.. cheguei lá nessa casa, quem nos atendeu, para não fugir à regra no nome, foi dona Severina, não é, foi dona Severina mesmo, que é uma senhora, não é, aí, ficamos lá na varanda, batendo um papo, conversando muito com dona Severina, e, e dona Severina: 'senhor moço, o senhor é do Rio mesmo?' eu digo, 'sou, senhora dona Severina, sou do Rio mesmo.' 'mas sabe porquê? é porque eu estou conversando com o senhor, o senhor é carioca e eu estou entendendo tudo que o senhor está me dizendo. tudo que o senhor está me dizendo como carioca eu estou entendendo. mas meus sobrinho não; vão lá para o Rio de Janeiro, passam lá quatro, cinco mês, quando chegam aqui, eu não entendo nada do que eles dizem!'. ai é.... então, eu vou lhe dar uma explicação, ó dona Severina: 'é o ambiente que o sujeito, que a pessoa vive lá no Rio. é porque o seu sobrinho, é o seguinte: o rapaz...' - eu não vou dizer seu sobrinho, não é,. hum, hum.. depois eu fui até saber, depois ela me mostrou uns quadros na parede, ela era irmã de dois escritores paraibanos famosos. hum, hum.. não é, lá, tinha lá os nome dele.. hum, hum.. pessoas, ela morava até numa, essa casa é uma casa muito boa, apesar de ser em Guarabira, era uma família de muito recurso - então, ela dizendo para mim. eu digo 'olha, vou lhe explicar, dona Severina: seus sobrinho vão daqui para lá. quando a pessoa está no Rio, manda chamar e acolhe a, tal. mas o rapaz sai daqui para lá para procurar emprego, não encontra, é do ambiente que ele vive. eu sei o que é. eu sei o', eu vou dizer assim 'eu sei o que é.' 'é, porque ele chegam aqui com umas conversa, sabe, seu Paulo, uma conversa que eu não entendo.' eu digo 'já sei o que é, é: 'estou numa boa', não é isso que eles dizem para senhora?', não é, 'estou numa boa, porque agora, não sei quê, comigo é i[...],' 'é, exactamente, exactamente isso que ele, eu não entendo, não entendo nada do que ele fala, nada do que ele fala.' então, eu estava explicando a ela que é do ambiente que eles vivem aqui... . hum, hum.. até, vão trabalhar nessas obras, nessas obras, frequenta-se meio de, de, de, de favela, e essas bodega e tomando essas pinga, eu dizendo para ela, não é, naqueles botequim, naquilo tudo e... então, eh, eles conversam naquele meio, entre eles. isso é conversa de gente, é só, 'está me entenden[...]?' 'não, agora eu estou entendendo o que o senhor está dizendo, porque o senhor diz que é carioca, eu estou entendendo o senhor está falando, eu não entendo os meus sobrinho, quando vão para lá e voltam para aqui, e vêm de volta. hum, hum.. eu não entendo eles.' pois bem, então falam muito assim. e muita coisa varia, não é, por exemplo, nós aqui no sul dizemos 'estamos com pressa', não é, . hum, hum.. [...] está com pressa, está com pressa mesmo; se está com vergonha, está, nós estamos avexados, não é, está um pouco avexado. lá já não, não é, eles chamam às vezes 'vem cá, vem! ó, ó Zé, vem cá, Zé!' ele grita 'não posso não, seu, não posso não, seu, estou muito avexado, estou muito avexado.' está com muita pressa. . pressa, não é, . é, está com muita pressa, está muito avexado. então, o nordestino é assim, eles têm esse sotaque. o cearense fala... já mais can[...], o cearense fala cantando também... um sotaque muito estridente. o ce[...], o... norde[...], esse, esse é do paraibano, não é, ele é muito paraibano. o baiano já não. o baiano, para mim, tem uma... diferença. o pernambucano fala assim, como se estivesse conversando consigo, mas é como se estivesse discutindo, sabe, . sim.. principalmente o, o homem de dentro mesmo, o sertanejo, ele conversa assim, como estivesse discutindo, sabe como é, ele gesticula muito, bate muito, não é, e . hum, hum.. no modo dele... falar. e.... e essas diferenças assim.... agora, eu vou lhe contar uma diferença muito interessante. eu cheguei no Pará, então, no Pará usa-se muito, depois, mais tarde, não é, eu mesmo - quase como se fosse uma pesquisa - no Pará, fala-se muito o português de Portugal. . não, é?. é, o português com muitas palavras do português de Portugal. porque nós falamos o português, mas o português em Portugal . hum.. falamos completamente diferente. por exemplo, no Pará não diz 'tem uma esquina', 'tem um sobrado'. no Pará não diz aqui nós dizemos 'na esquina... da Álvares de Miranda', não é, 'com a avenida suburbana', 'você vai lá, fulano, no sobrado, está,' no Pará diz 'no canto da rua tal', 'nos alto', que é o sobrado, não é, por exemplo, 'vou fazer, vou,' aqui, como você diz, 'vou fazer um terno'. hum.. 'um terno de roupa'. no Pará, 'eu vou fazer um fato'. . um fato.. é português.. ham, ham.. português. porque é um terno, todo mundo sabe que o terno é, são três, é paletó, colete e calça que hoje está voltando. chama-se um terno, não é, . hum, hum.. colete, calça e paletó, um terno. porque tem a palavra de um terno? você diz 'esse aí é um terno', não é, porque é o terno: calça, colete e paletó. então no Pará ainda se usava muito. terno, usava. então, prepararam a comida no Pará, assim na nossa chegada, isso foi o primeiro contacto. nós, cariocas, com o paraense. e prepararam uma comida rápida. a comida mais rápida que eles encontraram foi cortar uma carne seca, para eu, para mim aqui, para você. cortaram uma carne seca e fizeram uma farofa rápida. aí, me veio aquela comida, nós começámos a comer e foi um tal de, é, beber água que não dava para nada. aí, veio um rapaz, um rancheiro, nós estávamos na primeira bateria mo[...], primeira bateria automóvel.... hum, hum.. chamavam automóvel porque ela lá já tinha sido infantaria, não é, cavalaria, infantaria, e estavam fazendo um motorizado, botando ela já motorizada: carro, não é, veículo, viaturas.. hum, hum.. e a mesa era de quatro pessoas. sentávamos quatro na mesa. . certo.. ele chegou, disse 'olhe, não repare não, porque a jabá foi feita avexada.' poxa, aí olhamos para cara do outro, 'não repare não, a jabá foi feita avexada.' traduzido: 'não repare não, porque a carne seca foi feita às pressa.'. hum.. por isso ela estava salgada. |
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Brasil | Rio de Janeiro | M | 41 | Década de 80 | o senhor sabe fazer alguma coisa na cozinha? . na cozinha? . hum.. sei, o que é que eu não sei fazer na cozinha? feijão, arroz, fritar um bife. um bom churrasco é comigo mesmo, um angu caprichado, uma sopa de siri.... é.. e como faz. comigo mesmo, um café.... um bom churrasco?. ah! um bom churrasco, você pega a carne, lava a carne direitinho, joga um sal grosso na carne e leva ela ao fogo, simplesmente. é o bom churrasco. é o churrasco gaúcho, é. porque a carne com um certo tempero, ela fica enjoativa, então você assa a carne só no sal e prepara o molho à parte: cebola, tomate picadinho, alho, vinagre, azeite, certo, sal, mais um pouquinho, uma pimentazinha de leve; então depois a pessoa que gosta bota no prato. hum, hum.. à parte, uma farofa! isso é que é o churrasco... ao molho.... e você foi aprendendo.... certo, não, isso é, a vida vai ensinando, certo, é, um reservista de primeira categoria como eu fui tinha que fazer certas coisa e faço até hoje, quando a patroa às vezes vai para praia com as criança ao fim-de-semana, ela vai Segunda-feira e eu só vou fim-de-semana, certo, então, eu fico em casa, eu tenho que fritar um ovo, eu tenho que fazer um cachorro-quente. cachorro-quente também é fácil de fazer, você pega salsicha ou linguiça, se for linguiça você tem que escaldar a linguiça. escalda, tira, vai tirar um pouquinho do sal. hum, hum.. faz aquele tempero, um molho de tomate, cebola, pimentão, aquilo que a pessoa gosta. depois, corta um pãozinho ao meio, bota a linguiça, bota um... queijinho parmesão dentro, uma maionese, certo, é isso aí.. [...]. é um cachorro-quente. quer dizer que eu estou inteirado nesse assunto, não é,. está legal.. se tiver que fazer um bolo, eu também sei fazer um bolo de aniversário. . nossa! mas está [...]. ah! sei! porque é que eu não sei?. e não tem preconceito não? de homem?. não, não tenho preconceito. eu sou mecânico mas também se, se tiver que ser padeiro, eu também vou ser padeiro. tudo bem. isso é questão de, de tocar para frente. tudo na vida se aprende, meu amigo, certo,. e, assim, o senhor sabe que nortista fala carregado, não é, . fala. . que é que o senhor acha disso? da fala deles? . ué! cada um fala da maneira de aonde nasceu, do seu estado, certo, . mas quando o senhor ouve esse alguém falando que é que o senhor acha? . não, eu não sinto nada, é. simplesmente, coitado, ele está falando da maneira que ele aprendeu a falar, certo, como o português, por exemplo, o português, quando ele vai falar 'vasco', ele não fala 'vasco', ele fala 'basco' e quando ele vai falar 'botafogo' ele fala 'vastafogo'. então, quando ele não é 'basco', ele é 'vastafogo'. é isso aí, meu amigo. . e o que é que o senhor acha do jeito do carioca falar em relação ao resto do Brasil?. bom, o carioca é aquele que gosta sempre de estar brincando com os outro, certo, o carioca, sempre, está gozando os outro. [...] o, o carioca está sempre com aquela de brincar com os outro. então, o carioca gosta de gozar mesmo os outro, certo, quando ele pega uma falha qualquer, ele já nega, mas ele também não esquece que muita das vezes ele fala as coisa errada, não é isso? o carioca, muita das vezes, fala as coisa errada. . hum, hum.. no momento eu não lembro de nada que o carioca fala errado. |
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Brasil | Rio de Janeiro | M | 32 | Década de 80 | então, que é que o senhor acha dos jovens, por exemplo. acha de quê? . de hoje em dia? dos jovens... de hoje em dia. a cabeça deles, como é que vai ser tudo isso... com o pensamento que, que eles têm? o futuro dessa geração... . é outra pergunta, também, meia, não é, para gente entender a mente de um jovem hoje em dia, está meio bravo. . senhor acha? . eu acho. . mas você se considera assim realmente de outra geração, bem... . não, eu não me considero de outra ge[...], ge[...], geração, não! eu sou de uma geração que não é tão antiga, não é, sou de cinquenta e um. mas, sabe, eh, eu se chegar perto do meu pai e chamar 'aí, ó pai! você...' já é motivo dele me olhar de, me[...], meio atravessado. você sabia disso? . jura? . é. e meu filho chega para mim e fala assim 'ó co[...], ó baleia!' é, meu, meu filho me chama de baleia, barril de chopp, mas eu já crio meu filho na geração de hoje. é.. sabe, eu brinco de lutar com meu, com meu filho, caramba! meu pai nunca me permitiu. agora, ah, sabe, eh, sei lá! essa geração de hoje em dia está meio estranha. muito, mesmo. depois, então, que apareceu essa série de, de troços aí. olha, eu sempre gostei de uma coisa, de duas coisas, desde que eu, q[...], que eu me conheço. eu com... dez anos de idade, eu conheci um cigarro, começei a fumar de brincadeira, não sei o quê, estou aí até hoje, com trinta e dois anos eu fumo. . e o senhor daria liberdade para o seu filho furar, fumar? . dou! . dá? . ele man[...], eu mando ele acen[...], ele acender o cigarro para mim, ele se engasga, sai tossindo. eu dou, para ele ver o que é que é! se ele gostar, ele vai a luta! sabe, acendeu duas vezes, pergunta se ele quer acender mais! meu filho, quando tinha dois, três, três anos, uns três anos mais ou menos, ele sentava... atrás do carrinho de chá, onde eu tinha lá minhas cachaça, meus troço lá, meu, meus licores, ele abria e zip, [...] até o dia que se engasgou. pergunta se ele, se, se ele [...], se, se quer, se ele quer sentir o cheiro. se e[...], se ele está aqui do meu lado, eu estou fumando: 'pô, pai! essa fumaça!' a única coisa que ele ainda gosta, até hoje, é botar cerveja para mim porque faz espuma. aí, ele bebe a espuma. também, só, só. mas ele, quando era garotinho, pegou lá, uma vez pegou um copo lá, eh, sabe, ia sempre, pegava o mesmo, botava, 'hum!' gostou! a gente não via! até o dia que nós encontrámos ele atrás do carrinho de chá, se engasgando todo, porque tomou uma dose de pura. aí se desgraçou todo.. coitadinho! . é.. e o senhor vai dar muita liberdade, assim, para eles, [...]? . eu, olha, eu crio o meu filho, os meus filhos, eu crio com a liberdade de hoje em dia. agora, a liberdade dentro do limite, não é, dentro do limite. que ele, com todo o tamanho dele, já é abusado. se der trela, você não, você não aguenta, não, cara! . mas abusado como? . ah, já quer me... confundir os troços, sabe, você... fala um troço, 'ah, não enche, não sei o quê e...' pergunta à mãe! eu nunca dei um tapa! . não, é? . eu só olho para ele! . nunca bateu? . nunca bati nos meus filhos. ela bate, não sei o quê. eu nunca dei um tapa. [...] . só dei-lhe um tranco uma vez! . é? . [...] dei-lhe um, sabe, um tranco, assim, ele, eu só olho para ele, já é motivo dele ir para o canto chorar. . ai é? . não sei se é respeito, se é medo, sabe, pode ser até medo, não é, . claro. . mas eu nunca dei um tapa nele. eu só prometo. 'ó! tu se cuida, malandro! te cuida que eu vou, eu, eu vou te achar, heim! e a hora que eu te achar, fica ruim!' oh! 'nada, acha nada!' sabe, aquele negócio de criança! . e a menina? . e.... a menina? a menina, oh! uma coisa maravilhosa. . a menina no futuro vai dar mais trabalho, não é, que a menina sempre é mais trabalhosa, não é, educar uma filha, é sempre mais difícil, não é, . a menina já dá trabalho, cara! . já dá, não é, . já dá. atrevidinha, folgad[...], com aquele tamanhinho que você viu aí, o irmão não mete as cabeça com ela, que ela enfia a mão no irmão! com aquele corpo todo dele, ela, ela encara ele mesmo! ela, ela, aí! ela já é totalmente diferente dele. é atrevida, mesmo! atrevida. aquele narizinho, mesmo, de, sabe, atrevidinha, ela. . mas o senhor vai manter uma relação, assim, de bastante diálogo, não é, . ah, eu tenho. . é. . é o que eu disse, eu saio, passeio, quando posso. também quando, sabe, se querem tomar um sorvete, se eu tenho dinheiro, a gente vai, vai tomar o sorvete. se não tem, não vai. ontem saímos daqui, vi[...], vimos o filme dos Trapalhões, acabou oito horas da noite. aí, peguei eu, ele, as mulher, as criança, não é, vá, aí, fomos ali, sentámos ali no, no bar da Toninha, ali, do lado da Estácio de Sá, faculdade. pedi uma lasanha para mim e uma lasanha para ele. ele, com sete anos, comeu a lasanha que eu, com trinta e dois, como. . pô! . nossa! . e uma outra lasanha dividiu entre ela... e a garotinha. ele sentou do meu lado 'pai, pá, vamos comer lasanha?' 'vamos lá!' caímos dentro de uma lasanha, eu e ele. ele comeu u[...], ele comeu a dele, eu comi a minha, com sete anos de idade. ah, então... . você e sua esposa vão querer ter mais filhos? . não! ela, quando nasceu a garota, ligámos. man[...], mandei ligar porque dois basta, mesmo. . é. . já está ligado já... quatro anos, já. já vai fazer cinco. . não, não se arrependeu? não se arrependeram, não é, os dois. . não, porque eu sempre quis ter um filho. eu não, ela, não é, primeiro o homem. nasceu homem. aí, começámos a brincar, aí, depois de três ano aí, começámos aí, pá, não sei o quê, se distraímos, aí, punft! aí, veio uma garota, não é, aí, falámos ass[...], 'se for uma garota mesmo a gente liga.' ou garoto, ou garoto, ia, sabe, já estava tudo programado para ligar. eu acho que... um filho é bom, não, um filho é pouco, dois é bom, três é dose. . é dose. . três é dose mesmo, cara! dois, eu já me vejo doidinho, aí! esse moleque almoça duas, três vezes por dia. você acredita isso? . nossa! . o que bo[...], o prato de arroz e feijão e carne que bota para mim, bota para ele igual, que ele mata. o cara é, o cara é indigesto, mesmo! . tal pai, tal filho. . e eu não i[...], e eu não proíbo. eu prefiro que coma, do que eu ir levar para médico, gastar com médico. . claro. . [...] . esse meu garoto, não cortando você... . [...] . é um caso muito, esse meu garoto, aí, com dois meses e meio, ele arrancou duas hérnias. . pô! . com quatro meses, ele teve inf[...], duas ou três infecções, infecções intestinal, catapora com varicela. se reparar, ele tem o rosto todo furado . hum, hum. . de catapora e varicela que deu junto. esse moleque até uns dois anos, pô! bota dinheiro nisso que, dinheiro e susto, convulsões, uma em cima da outra, e não sei o quê e 'pereré'. mas sim, qual é a sua pergunta? . era o Gerson. . ah, era eu. assim, sobre a mulher actual, por exemplo, mulher que trabalha fora... . maravilhosas! . é? a sua esposa não trabalha fora. . não, nunca tra[...], quer dizer, antes de, de nos casarmos, ela trabalhou com uma amiga minha, trabalhou uns, ainda uns dois meses. . hum. . aí, logo depois, nos casámos, aí, nunca mais. . isso... . agora, me ajuda muito. me ajuda muito. agora. nos... . o senhor não se importaria se ela trabalhasse? . olha, eu acho que é, se ela fosse trabalhar fora, ela teria que ganhar muito dinheiro. . porquê? . porquê? . porquê? porque, pensa bem! quanto é que ganha uma empregada? quanto é que uma empregada de casa de família quer ganhar hoje em dia? . vinte mil, não é, . mais... . pô! vin[...], vinte mil, eu pago à, à primeira que chegar aí! . está muito mais, Gerson! está trinta, quarenta... . é trinta e cinco para, para frente, cara! é, trinta e cinco para frente. então, a minha esposa não tem, ela tem o quê? ela fez curso de Eugenia, na MESBLA, e... tem curso de dactilografia que não faz há muito tempo. então, ela iria ganhar o quê? salário mínimo? vinte e poucos mil cruzeiro. e eu iria pagar de empregada trinta e cinco. para quê? para ver a minha mulher, na rua, recebendo os cochicho, cantadas, que qual é a garota que não recebe uma cantada? qual é a mulher que não recebe uma cantada? daqui ao mercado ela recebe trinta cantadas, no mínino! no mínimo, cara! é! sabe, daqui ao mercado, ali, a quinhentos metros, ali... . mas o senhor também recebe! . eu recebo nada! eu dou as minhas cantadas, se colar, colou; se não colar, saio fora. mas o, o negócio é esse, cara! sabe, não, eu... . então, a preocupação é essa, com as cantadas? . não, não é, não é as cantadas. é que ela não vai ganhar o suficiente para cobrir uma pessoa que fique no lugar do meus fi[...], lugar dela, dentro de casa. e não vai criar meus filhos do jeito que, que ela cria, está, e muita coisa mais! muitas coisas mais. |
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Brasil | São Paulo | M | 22 | 1987 | eu sei o seguinte, eu, eu tenho minhas críticas tal, eu sei que... o sistema socialista tem muita, tem muita coisa ruim mas tem seus lado positivo. e como o sistema capitalista tem muita coisa boa, mas se faz, se se fizer uma análise concreta, e.... de estatística de po[...], prós e contras, não é, eu acho que o capitalismo sai muito mais defasado, viu, porque, por exemplo, o direito, que é que é o direito? direito é o instrumento do estado que tem por finalidade manter a... organização... e dar... uma certa autonomia a cada indivíduo, não é, para se fazer, para fazer valer seus direitos. ham.. por exemplo, qual é a... parcela da sociedade que tem di[...], realmente direito na nossa sociedade? é vinte por cento. você acha que um men[...], um cara que é pobre por falta de condições?. por falta de conhecimento.. não, que conhecimento? por falta de, de, de, de condições materiais. você acha que uma pessoa pobre tem condições de invocar o órgão jurisdicional, por exemplo? pagar custas de processo? tem condições para conversar com advogado e falar 'olhe isso aqui é assim, assim, assim, e eu vou te pagar tanto.' não se tem, pô. o cara não tem condições.. agora, eu acho que, veja, eu estava vendo um, um artigo sobre as múltiplas delegacias que existem actualmente, certo, ah, então, aí eu estava era, eu mesmo não conhecia essas de[...], delegacias, e qual era a real função de cada uma delas, não é, não sabia. elas existem, estão aí. então, sabe, eu acho que a coisa começa aí.. não, porque quando.... a desinformação, a, a.... certo. bom a informação é importante, mas quando se fala em direito, você já, a gente que tem assim uma concepção mais, mais adentro, não é, mais adentrada, tal. assim, em termos de estudo de direito, você já tem uma visão totalmente elitista, como produto de uma, de uma classe da sociedade que faz valer seus interesses através de selecção de valores, ou seja, eles optam por uma lei, optam por outra lei... e quem são os legisladores? são os caras que legitimam isso aí, certo,. é, essa classe é elitista mesmo.. e quando você fala em, você fala em direito com um cara que é pobre, ele, para ele é um conceito abstracto de direito. ele só vê falar nisso aí, mas ele não tem a força, ele mesmo sabe que ele não tem a força de invocar o direito. porque não tem mesmo, depende, depende de, de in[...], de intelectualida(de). à cultura, o cara não tem direito a nada, meu, só vive que nem um animal.. e nem de acesso ao material que ele produz. e é o cara, e é o cara que produz esse prédio aqui, em que a gente está morando e tudo o mais. e então é a classe dominante que usufrui da i[...], da, de, da, da cultura, usufrui dos prazeres da vida, pô,. dos bens materiais.. e isso aí é justo com a sociedade? não é justo, pô, agora há, há-de se falar em liberdade quando se fala numa sociedade socialista? é porque lá não existe liberdade. não existe liberdade tudo bem. isso aí é um mal que tem que ser combatido. combatido, ferran[...], com, com, com muito, como é que se diz?. vigor.... com muito vigor, tenacidade. mas não se pode falar em liberdade antes de se falar em subsistência, pô, a subsistência é, a existência é... primordial da vida. como é que se vai se falar em liberdade se você não tem condições nem de subsistir como gente?. é, pois é, mas.... aqui você tem liberdade, por exemplo . ah.... para comprar u[...], uma calça, um cara que não tem dinheiro não tem.... sim, mas veja, isso no plano que nós analisamos. porque nós estamos vivendo nessa sociedade, não é, em que as coisas são totalmente deturpadas. agora . por exemplo, quando se fala em liberdade.... na sociedade socialista que se falam tanto. hum.. que se apregoam tanto, como você falou no plano filosófico, não é, é, até aí.... não, não, no plano filosófico não é em termos de, de, de aplicação prá[...], prática, não é,. certo.. serve como concepção de vida.. concepção. é.. mas vamos falar em termos de aplicações práticas.. aí tem que partir para o lado político.. exacto. o plano político, está, então nós sabemos que, ah, estão, tentaram aí porque eu acho que foi uma tentativa que se fizeram, não é, nos países do leste de implantação do socialismo.. não, não é, eu acho que não é tentativa, acho que é produto. porque. produto de relações, não é, [...]. é porque, você veja, agora, o que aconteceu? o que aconteceu foi que uma classe dominou toda a situação, e domina a situação. agora, quando Lenine falou-se numa re[...], im[...], implantou uma revolução, ele falou numa ditadura do proletariado.. exatamente. falou.. e na verdade não existe essa ditadura do proletariado. . hum, hum.. porque a coisa ao longo do tempo foi transformando, aquele transformacionismo que a gente sabe que acontece em toda sociedade ao longo do tempo.. é porque o dinamismo é, é, é, é ele existe em tudo o que existe na, na natureza. é. dinâmico.. tudo, tudo é dinâmico. nada é estático.. [...] nada, nada pára.. como o pró[...], como a própria sociedade é estática, tanto é que você, fazendo uma análise histórica, você sabe que nós começamos numa, numa, fase de produção escravista, passamos para uma fase de produção, eh, feudal onde existia o servo e o escravo e não se parou por aí. entrou no capitalismo comercial, não é, industrial e hoje a gente vive uma fase do capitalismo avançado que é o, o imperialismo. . certo.. hoje o, a 'célula mater' do capitalismo que é os Estados Unidos vive de juros dos países do Terceiro Mundo.. [...]. isto é imperialismo, ou seja, ela vive do factor monetário, não é, preponderante [...] então o que é que acontece? é dinâmico. então a, o próprio socialismo, ele surgiu de uma contradição. Marx disse que, eh, um país se tornaria socialista, quando a... sua relação de produção capitalista se tornasse altamente desenvolvida, e isso não se deu. e por que é que não se deu? porque ele Marx viveu uma época, certo,. é.. e nada é estático, e tudo se transforma.. [...]. e o que é que aconteceu? aconteceu que em mil novecentos e dezessete, a União Soviética, a Rússia, ela tinha uma relação de produção eminentemente feudal, onde havia os czares e havia os servos. então o que é que havia ali? havia uma contradição muito grande, muita riqueza e muita probreza. daquela contradição houve choque, choque de interesse, e deu-se uma nova relação, que foi a relação de produção socialista.. hum.. então é produto histórico, como Cuba também era. Cuba em mil novecentos e cinquenta e sete o que é que era? reduto de americano, prostituição, contrabando de drogas e miséria. contradição de sociedade, surgiu uma nova coisa. então o Brasil vai passar por isso. mas quando? quando... tiver muita pobreza e muita riqueza. e quando isso vai se dar? a gente vive uma relação em que uma parcela da sociedade cada vez fica mais rica e uma parcela fica mais pobre. então vai chegar um limite, um momento histórico, em que isso aí entra em hist[...], entra em choque, estoura. é produto histórico, natural, concorda? |
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Brasil | Rio de Janeiro | M | 31 | Década de 80 | ah! mas aí, quando chegou o dia, não é, da op[...], aí a doutora marcou 'vamos fazer dia dez de Maio.' aí, pronto, eu sofri até o dia dez de Maio. quando chegou dia dez de Maio que eu ligo para a doutora 'não, deixa para o dia treze de Maio.' eu falei 'oh, uma bonita data, dia de preto velho, tudo bem. está, está melhor.' quando chegou no dia treze que eu ligo, que eu liguei no dia doze 'não, deixa para o dia quinze'. eu falei 'doutora, se a senhora me troca mais um dia, eu me mato.' e eu com medo, não é, podia, porque ela não podia mais sentir a dor do parto assim. ela tinha que ter um parto, hum, sem dor. . hum.. porque a, a placenta estava no[...], quase no colo do útero. se ela chega no colo do útero, a placenta sai na frente e a criança fica atrás, morre. e t[...], você sabendo disso, qualquer ser humano, é, sofre. aí, graças a Deus, no dia quinze ela fez a cesárea, foi onze horas, quando foi onze e vinte me deram a notícia. estava eu e o meu cunhado e eu só fazia chorar de nervoso, não é, porque nessa, eu sou muito bonzinho e tudo, mas nessas horas só faço chorar, meu nervoso ataca para chorar. pessoal até me encarna de bebé chorão, mas eu não tenho isso comigo não. eu choro mesmo. aí, quando o médico chegou, não é, falou assim 'quem é o papai?' eu só fiz assim. eu não tinha nem força para falar de tanto nervoso. 'é uma menina' eu só faltei dar um ataque de tanta alegria e esqueci até que eu estava contando com Rodrigo. e ela anestesiada e o médico depois perguntou 'como é que é o nome da criança?' eu falei 'sabe que eu não sei.' eu falei 'bom, se fosse menino ia ser Rodrigo, agora, menina eu não sei. ah! bota Carolina!' porque quando, assim, eu me juntei com a minha mulher, eu não estava numa boa em casa, a senhora sabe, a situação estava periclitante para mim. que eu sempre briguei muito com meu padrasto e realmente eu não estava numa legal com eles. então, eu acho que a minha mulher apareceu na hora exacta para mim. mas não foi por causa disso que eu me juntei com ela nem nada. nós se juntámos, porque ela, não sei, ela, eu acho que ela ainda gosta mais de mim do que eu próprio dela. ela tem uma certa gamação por mim que é fora do comum. o que ela puder fazer por mim, ela faz, sabe, é o tipo de pessoa que é assim, qualquer coisa que eu depender dela - e eu também faço por ela que eu gosto dela demais, não é, porque eu tive muitas aventura na rua e nunca quis ter filho com ninguém. já com ela eu aceitei a criança porque eu gostava dela e, e senti nela, você sente quando a pessoa é. hum, hum. . legal. então acho que... não tem jeito. ali estou mais amarrado do que se eu fosse casado. para separar ali vai ser uma briga. porque - eu nem quero pensar nisso - porque, assim, eu amo a minha filha demais e amo minha mulher. e eu não acho legal a gente ter o filho com uma pessoa, o pai viver num lugar e a mãe viver em outro. eu acho que de acordo, tem que procurar contornar a situação, procurar viver bem, procurar se entender, conversar bastante, ter bastante diálogo, que eu acho que é o que falta no, na maioria dos casais hoje em dia é o diálogo, para poder ter uma vida assim bem, sabe, sem briga, sem esse negócio de atrito, sem essas confusões toda. eu cá acho isso besteira, não leva a nada. . hum, hum.. e sou contra, também, os homem que bate em mulher, porque eu acho assim: a mulher não serve para o homem, larga. aí, quando um casal chega a ponto de partir para a agressão eu acho que já não dá mais para viver junto, então cada um para o seu lado. se eu digo para a minha mulher 'se eu quis essa criança, é porque eu te amo e sei que você me ama', porque você viveu dez anos casado com uma pessoa, você nunca quis um filho, então você querer o meu é porque você gosta demais de mim. então desde o momento que eu sei que você quis essa criança é porque você me ama, então eu também te amo, vamos viver nossa vida. . hum! que bonito! . é. é, tudo tranquilo. porque a outra - eu namorei a Sueli dez ou doze anos - a Sueli nunca quis. tira duas criança. o primeiro houve um probleminha, ela teve que tirar. tudo bem, eu tive que aceitar. na época eu sofri à beça, estava com uns vinte e um ano. eu sofri muito. mas já o segundo não. fez, não me falou nada, quando eu vim a saber já tinha feito. então, acho que desde o momento que ela fez isso, não tomou assim nem uma, assim, não teve consideração nenhuma comigo, não é, porque ela para fazer, tinha que falar comigo. não falou. e eu, e eu qui[...], sempre quis assumir, não é, um compromisso com ela. ela que sempre me dava uma volta 'ah, nenam.' então, eu achei que aquilo foi demais. e continuámos mais por algum tempo assim, mas não deu para levar o barco muito adiante não. . hum.. aí começou briga, briga, briga. fiquei revoltado, aí fui perdendo aquele amor que eu tinha por ela, acabou. aí tem aquele ditado que 'amar só existe uma vez', mas eu acho que para mim não, existiu duas. porque eu amei muito Sueli, mas hoje em dia se a Sueli vem coberta de ouro, eu não troco a minha mulher por ela. eu sou ainda mais a minha mulher. |
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Brasil | Araraquara - S. Paulo | F | 26 | 1993 | e você lembra alguma festa na escola?. esse ano?. que aconteceu assim de bom?. lembro sim.. ham.. foi maravilhoso. . ham.. foi quando a gente combinou com o professor de matemática, a gente sempre brinca 'ó, vamos num churrasco? vamos numa pizzaria?' e aquele dia realmente a gente combinou sério de ir. até ele falar 'ah! mas é hoje que a gente vai?' a gente falar 'se você não quiser ir hoje não tem problema.' de repente todo mundo se animou. não foi a classe inteira, é lógico, que a gente não combinou com a classe inteira, mas foi o Tabajara, eu e alguns alunos. de repente a hora que a gente estava na pizzaria, eu não me, eu não me lembro, ali perto da, da,. da escola mesmo.... ah! sei qual que é [...]. Trattoria acho que é. aí nisso ia passando a Rosires, que é nossa directora, a Eliana, a Maria, não é, que é de inglês, aí a gente chamou todos ele lá dentro, foi maravilhoso. aquilo que era para ser só uma cervejinha que era o combinado acabou assim saindo em pizza, não é, acabou em pizza como fala o ditado realmente. e ficamos ali até meia noite e meia, quer dizer, cada um tinha seu compromisso, seu, a esposa esperando, eu não, é lógico, mas eles tinham e foi muito gostoso porque a partir dali nasceu uma amizade mais gostosa com o professor. além de ele ser o professor, ele foi o amigo da gente. então quer dizer muito mais evento desse deveria acontecer, não só com eles em si mas com a família deles, tudo. nós, como eu te falei vira uma família, a escola. então foi gostoso.... e assim como é que é o caso da Maria que você estava me contando? que é...?. foi logo no começo assim. ela chegou assim como um general. ela disse assim que a estrela da classe é o professor. não deixa de ter uma razão. só que ela chega com uma certa autoridade, logo no primeiro dia ela não cativou os alunos. ela já chegou assim meia rude e... ela pediu para escrever uma palavra na lousa, toda a gente escreveu logicamente, ninguém nasceu sabendo inglês, a gente sabendo inglês esse ano, tudo, não é, já vi na quinta série mas só na quinta série. e por falar, inglês é uma língua que eu quero aprender. eu adoro inglês, adoro. até meu irmão faz, minha cunhada faz, as criança dele faz, já estão falando super dez, canta as músicas, já dá para acompanhar. eu acompanho aquela, uma 'Unchained Melody', não é, que você deu.. sei, sei.. aquela lá se estiver cantando, eu sei acompanhar. eu adoro. o que você deu assim bem explicadinho, adoro, dá para acompanhar aquela lá. é uma pena que o dia que você mostrou o filme, 'Ghost', não é, eu estava hospitalizada mas foi uma pena porque todo mundo falava de você na classe. que realmente você incentivou para caramba, que além de você mostrar o filme, não foi assim só para a gente ver o filme. teve um fundamento, você fez aprender, ensinar para a gente também, vendo o filme... e a letra da música. pena que não deu, que o horário da aula foi muito pouco, não é, para gente assistir o filme inteiro, para o pessoal assistir que eu não assisti. então foi assim superlegal. e ela, como eu estava dizendo. é.. me chamou a atenção. e eu por ser uma aluna quieta, não sou de mexer com ninguém, fiquei chocada com a atitude dela falei 'poxa, tan[...], gosto tanto de inglês, mas pelo professor vai ser um pé no saco esse ano.' pelo contrário, conheci a pessoa dela nesse dia que a gente foi na pizzaria, é uma pessoa excelente, quer dizer, aquele conceito que eu tinha dela acabou. ela é uma pessoa legal. então, só que apareceu uma santa Mariliza no lugar dela que realmente dá aula de inglês superlegal para a gente.. [...]. então você acha que é assim. . é uma família mesmo [...]. é uma família, sem dúvida, é uma família. a gente pegou uma amizade, uma amizade gostosa com todos eles. você, a gente só vê s[...], Sexta-Feira mas sente saudade, não é, porque a maioria das Sextas-Fe(iras). (fe)riado, não é,. [...]. e você [...] a festa junina que teve?. não fui porque mais uma vez eu estava hospitalizada mas todo mundo falou que foi superorganizada. eu gostaria de ter ido. disseram que foi muito bem organizada.. e você acha que falta isso na escola, ter mais festinha?. falta mais incentivo assim para a festa, mais... agito, não é, o pessoal adora agito, não é, agito logicamente sem briga, que aí está feio, não é, . mais [...]. mais festinha. achei legal eles emprestarem a... cozinha para a gente fazer festa quando alguém faz aniversário. ontem por exemplo teve uma festa superlegal. como é que foi?. de outra classe, ah, deixaram, tudo bem, falar bebida alcoólica, uma cerveja não é bem uma bebida alcoólica, é uma coisa superfraca.. hum.. e foi assim, não foi para to[...], ninguém se embebedar. teve cerveja, teve refrigerante, teve o bolo, foi uma coisa superlegal.. e todos participaram? como é que foi?. não, assim, eu achei legal isso, porque, cada um você sabe que cria um vínculo, assim de amizade, assim um grupinho, você tem amizade com todos mas cada um tem o seu grupinho mais legal. achei legal porque ninguém se intometeu na festa deles. ninguém foi abelhudo, abrir a porta 'o que é que está acontecendo?' foi uma coisa assim superlegal. participou aqueles que eles acharam que tinha que participar. como eu achei que foi superlegal essa ideia, se a gente fizer alguma festinha, a gente também combina e faz, quer dizer, é uma coisa assim que cada um soube respeitar o espaço daquele, foi muita gente, isso a gente viu, a gente estava lá no pátio, a gente viu, foi legal.. de quem é que era o aniversário?. você não participou? foi aniversário.... não, fui embora.. foi superlegal. gostei.. foi aniversário da.... tem uma certa liberdade ali de brincar, tudo. acho que deveria ter um pouco mais de respeito da parte dos aluno. isso deveria, que eles a[...], eles confundem muito liberdade com, tem uns que é meio selvagem ali, sabe, é o termo certo de usar, porque de vez em quando o que acontece é uma selvajaria, mas é legal sim.. então há esse negócio de liberdade, não é, que você está falando.... hum, hum. tem que dar liberdade mas ao mesmo tempo tem o respeito. isso daí tem que partir dos próprios alunos, não é,. que nem o negócio de ter que chegar na hora, senão a porta está fechada, o que é que você acha disso?. eu acho isso daí muito bom porque senão vira bagunça, a gente assim... fica chateado quando acontece com a gente. fala 'poxa! eu trabalhei até agora, saí um pouquinho mais atrasado, chego aqui está fechado.' mas tem que ter isso daí. a gente tem que ter consciência que tem, senão vira bagunça.. você acha?. o professor está dando aula chega um aluno 'ah! dá licença? posso entrar?' pega a coisa na metade. realmente tem que ter uma disciplina de um horário.. você acha que os alunos não são, assim, adultos o suficiente.... quando eles colocaram sete horas sem esse chorinho . ham.. dos dez minuto, eu achei ruim porque eu saía sete horas, quer dizer, tendo os dez minutos, eu, de moto, eu chego a tempo, não tendo os dez minuto. e agora como você vai resolver isso?. começou me complicar. |
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Brasil | Araquara - S. Paulo | F | 22 | 1995 | e como é que é ter uma irmã gémea?. olha, n[...], não, eu, eu sou leiga para falar. leiga não, sou suspeita para fa[...], leiga eu não sou, nem um pouco, não é, eu sou suspeita para falar, porque eu tenho uma irmã gémea e porque foi assim des[...], desde quando eu me conheço por gente, eu tenho uma irmã gémea, então eu não sei o que que é não ser gémea, está vendo, aí é que está o xis da q[...], da coisa, da questão, sabe, então nossa, a nossa infância, eu achei que foi, foi sem problemas, foi superlegal, a gente sempre assim com um olhar, uma já sabia o que a outra estava pensando, o que, em relação a alguma coisa, inclusive minha mãe, sempre, a gente levava altos pitos da minha mãe, não é, porque a gente ficava dando risada da minha avó, assim, uma olhava para cara da outra e ria por causa de determinada coisa que minha avó fazia, sabe, então essa parte foi engraçada. daí, nossa, aí quando... eu comecei a namorar, ela começou a namorar também, a gente foi se distanciando, tal, mas, problemas conscientes, eu posso falar que a gente não tinha, não é, mas problemas tipo complexo de Édipo, não é, deve ter alguma coisa, com certeza tem, não é, complexo de Édipo, assim que eu falo, é, porque o complexo de Édipo é o seguinte: a, é, a, a, a disputa da, a, da, na menina, é o complexo de Eletra, não é, então é a disputa do pai em relação à mãe, entendeu, então nu[...], num caso normal seria o seguinte: uma menina, uma criança mulher, ela disputa a, o amor, a atenção do pai com a mãe, sim, mas nos gémeos, eu tenho que disputar com a minha irmã e com a minha mãe, entendeu, . ham!. então eu acho que numa terapia que, o que... segue Freud, não é, a linha psicanalítica, talvez eu pudesse até descobrir, não é, algum problema [...], alguma coisa, entendeu, mas é legal ser gémea, assim você ter, mas, apesar de que com a minha irmã, tem coisas que eu não conto para a minha irmã, que eu conto para melhores amigas minhas, entendeu, porque ela é diferente de mim em muitas coisas, ela pe[...], eu acho que ela é uma pessoa muito mais preconceituosa, ah, eu não sei se foi a, a faculdade que fez assim, se é da minha natureza mesmo ser assim, não é, mas eu acho que a minha irmã, ela difere muito de mim em relação a preconceito, em relação a... muitas coisas que eu acho mito, eu acho tabu e ela acha que não, ela acha que tem que ser assim, sabe, então por aí que, que eu não consigo aprofundar tanto com ela, não é, algumas coisas eu não consigo compartilhar com ela como eu consigo compartilhar com amigas minhas, que não entende, não é, que eu tenho medo do ro[...], do, da repressão dela, entendeu, de ela estar me julgando, não é, porque um julgamento de uma irmã pesa muito mais que o julgamento de uma amiga, não é, é... diferente.. e, e agora que você está lá em Bauru e ela aqui... n[...], não teve, não tem diferença nenhuma?. não, não tem diferença não, eu acho que continua sendo superficial o nosso relacionamento, por ser irmã gémea eu acredito que nosso relacionamento é superficial, assim não era para ser, não é, [...] mas ela, ela é uma pessoa muito mais fechada do que eu, entendeu, ela não chega e conta coisas, assim, e eu também estou assim agora, não é, não estou mais contando tudo para ela. eu estou mudando em relação a isso também, não sei porquê também.... e você não acha pior isso?. acho . você quando vem para cá, ao invés de contar, de tentar compartilhar alguma coisa, ficar se fechando também?. ah, eu a[...], eu acho que, que é pior, não é, mas... é uma coisa que parece que está fora do controle da gente, do meu controle, não é, é uma coisa que parece que está fora, não sei porque acontece. . e nunca aconteceu de você estar longe dela, você se machucar e ela sentir, ou... o contrário?. não, às vezes, às vezes eu penso, Tininha, porque, que nem, quando eu sofri esse acidente que bati a cabeça lá no carro, tudo, eu, eu fiquei pensando: ai será que a Beta sentiu alguma coisa lá em Araraquara, tudo, não é, mas aí eu cheguei, perguntei para ela se ela teve algum tipo de pressentimento, ela falou que não, tudo, não é, mas quando ela sofreu um acidente de moto aqui em Araraquara e eu estava em Bauru, eu senti qualquer coisa, eu senti uma preocupação com ela naquela semana, eu pensei nela de uma forma diferente, eu não sei como, eu não sei o quê, o que assim especificamente aconteceu, eu sei que alguma coisa assim me fez pensar mais fortemente nela naquela semana, naquele dia, e aí cheguei, ah, cheguei, entrei em casa assim no, que eu abri a porta dei de cara com ela com a perna enfaixada para cima, assim, não é, aí foi, foi estranho.. e como que é? ela não tem namorado sério, tal, e você não está namorando na[...], você não tem vontade de sair junto em quatro, em casais? . tenho, tenho. inclusive, assim, me[...], mexeu comigo, sabe, de, de ela ter ficado noiva e eu nessa ainda, não é, lógico que mexe, não é, você pensa pô, minha irmã, minha idade, igual eu, está noiva e eu estou nessa ainda, será que eu vou casar, será que não vou, aparece um monte de dúvidas n[...], na minha cabeça, mas no fim você vê que... são pessoas diferentes, entendeu, são vidas diferentes. minha vida é completamente diferente da dela, não é, e.... e você acha que você cresceu muito mais que ela por ter ido estudar fora, ter ficado mais responsável, talvez alguma coisa assim?. tenho certeza. eu tenho certeza que eu, que eu sou, sou muito diferente dela, eu não, eu seria pretensiosa se eu estivesse falando que eu sou melhor do que ela, entendeu, eu posso até quebrar muito minha cara ainda por ser assim, entendeu, mas eu acredito que eu sou uma pessoa mais aberta, eu sou, eu sou uma pessoa que... pode fazer mil cachorradas comigo mas eu vou estar sempre ouvindo o que a pessoa tem a me falar, e se eu não ouvir, eh, eu vou ficar mal, entendeu, a pessoa pode fazer a maior cachorrada do mundo comigo, se eu um dia não encontrar com ela e falar 'porque é que você fez isso', sabe, querendo ou[...], ouvir com todas as letras a since[...], a sinceridade na pessoa, eu não, eu não vou ficar tranquila. a minha irmã não, ela já se fecha, se a pessoa faz alguma coisa que para ela, ela considera grave, ela não quer nunca mais olhar na cara, ela não quer nunca mais ver, ela fecha a questão e não fala mais sobre o assunto. e nisso não, eu não sou assim, tenho certeza que não . e como que é o relacionamento de vocês duas com a sua irmã mais nova?. é diferente também, ham, eu sinto que eu tenho mais afinidade com a Priscila do que ela, não é, a Priscila, ela brinca mais comigo, ela dá mais risada comigo, ela tem mais afinidade, não é, não sei se é porque eu fico fora a semana inteira, só vejo de fim-de-semana, pode ser por isso também, não é, mas é... aquilo que eu já falei, a minha irmã é mais fechada, a Roberta, não é, a gémea, ela é mais fechada, ela não é tão brincalhona, eu já, já sou mais extrovertida, já gosto de brincar, de... ficar pegando nela, ficar enchendo o saco, e minha irmã não tão assim, não é, ela é, ela brinca, brinca mas não tanto. . e quando vocês eram pequenas, vocês se vestiam iguais, tudo?. na maioria das vezes era, eram roupas iguais mas não assim mesma cor, tal, não é, tudo dois de paus assim, não é, nunca gostámos disso, ai menina, sempre foi assim igual mas cores diferentes, não é, mas mesmo estilo de roupa, tudo. conforme a gente foi crescendo, a partir de, de doze anos, onze anos, não é, aí, o estilo sempre foi igual, mas roupas assim nunca iguais, sabe, sempre a gente quis comprar roupa diferente, tudo. aí, quando e[...], ela escolhia a roupa que eu gostava na minha frente, eu ficava brava, porque eu queria aquela e eu não podia ter aquela que ia ser igual, eu tinha que escolher outra para não ficar igual a ela, não é, fo[...], foi bem por aí, assim na, na infância, foi ro[...], foram roupas iguais mas cor diferente, e ainda bem que minha mãe teve pelo menos a ideia de mudar a cor, não é, e depois, quando a gente começou a crescer um pouquinho a gente foi... mudando.. mas uma usa roupa da outra ou não? roupa dela é dela, sua é sua.. você está falando hoje em dia, como está?. é hoje, é.. hum, a minha irmã é o seguinte, não é, quando interessa para ela, ela troca alguma coisinha, ela empresta, tudo, mas tipo qua[...], a Fabiana que mora comigo, mi[...], minha colega de república lá em Bauru, eu troco muito mais roupa com ela que é minha amiga do que com a minha própria irmã, sabe, são coisas assim que me, isso daí me deixa muito irritada, me deixa muito irritada, porque a minha irmã tem o mesmo corpo que eu praticamente, não é, eu sei que eu estou mais gorda, mas tudo bem, tem praticamente o mesmo corpo, mas é aquela coisa dela, não é, ela é assim com as coisas dela, tudo, e com a Fabiana, é, por exemplo, na boa, assim eu vou, troco, sabe, ela usa meu perfume, eu uso perfume dela, sabe, pedindo, tal, falando, não é, não é também assim vai pegando, vai usando, sabe, mas é m[...], mais, mais tranquilo do que com a minha irmã. |
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Brasil | Rio de Janeiro | F | 54 | Década de 80 | ah, minha filha! minh[...], mulher de médico precisa... ser uma criatura assim, é, mui[...], muito - como é que eu vou dizer? - não ligar para certas coisas, entendeu, não pode ser ciumenta, não pode estar levando o negócio assim, você querer monopolizar teu marido porque não adianta, porque você tem que deixar de mão mesmo. você imaginou a mulher de médico ciumenta? que coisa horrível! é horrível! eu não tenho. nunca tive ciúmes do meu marido, nem um pouquinho. . nunca? . nunca! nem quando eu era ca[...], mocinha, garota, nunca tive ciúmes, não. porque não, não dá, sabe, ó Maria Lúcia, você habitua mesmo, você não te[...], acho que você no final, você mesmo que seja uma criatura ciumenta você, no final, você acaba se acomodando no, deixando de ser ciumenta, entendeu, porque ele, a vida dele diária é o dia inteiro lidando com mulher, com enfermeira, com colegas médicas, não é, com clientes, moça, velha, tudo, broto, de tudo quanto é jeito. agora, se você é ciumenta, você fica louca ou separa de uma vez, não é, ou separa.. você tem, também tem os telefonemas de noite, não é, . telefonema de cliente. eu acho que marido de, mulher, eh, ma[...], médico, se quiser enganar a mulher, engana com a maior facilidade. como é que você vai andar atrás do ho[...], do marido o dia inteiro? engana. você pode, pode dizer para você que vai dar um plantão, não dá; pode dizer que vai ver um doente, não vai ver. como é que você vai saber?. é.. então você, o, o negócio é você não esquentar a cabeça. deixa para lá, sabe, deixa o barco correr.. [...] aí, qualquer homem pode fazer isso. . ah! mas é, mas já, mas acho que médico tem mais facilidade para isso, sabe, tem muito mais, ele pode, ah, receber um telefonema, não, não ser de cliente, dizer que vai ver o cliente e não é, não é isso? como é que você vai saber se é cliente ou não é? e você vai, vai poder prender o marido dentro de casa? não, eu não. eu nunca prendi. não ligo. me dou muito bem com Paulo, no[...], nós não brigamos, já estamos casados há trinta e poucos anos, até já perdi a conta.... ai, que maravilha!. trinta e pouco. já perdi a conta até. mas eu me dou bem, a gente não briga assim, só tem, às vezes, umas coisas que a gente não está de acordo, não é, porque cada um tem.... sua manei[...]. seu modo de viver, de pensar, não é, mas não, briga séria assim, não tem, não. agora, eu digo o seguinte: se eu tivesse a mentalidade que eu tenho hoje, a experiência que eu tenho hoje, a experiência, não é mentalidade, não, a ex[...], a experiência. então, se eu tivesse a experiência que eu tenho hoje, eu não me casaria com médico. . porquê? . não aconselho a casar com médico, porque você vive só. vive sozinha. vive sozinha, porque você está muito bem com o marido, daqui a pouco [...] ele recebe um telefonema, tem que sair. e você não pode prender, não é, se tem um doente passando mal, você não vai dizer que não quer que ele vá ver o doente, não é, se está passando mal, tem que ir mesmo, não é isso?. [...]. eu oh!, vou te dizer uma coisa: eu não me casaria com médico. preferia casar com negociante que fecha a porta, fecha a loja, nem que fosse dono de armazém. é.. as[...], chega aquela hora, fechou a loja, vem para a casa, não esquenta. o médico, não. o médico sai do trabalho, vem para casa mas não, não te[...], não fica em casa. ele, daqui a pouco recebe um telefonema, quantos telefonema de madrugada, eh, duas hora, uma hora... e quando, quando eu me casei então, foi, foi o pior, foi a fase pior da minha vida, porque eu era muito criança e fui para fora, não é, então, menina, eu ficava sozinha! sozinha! ele, de madrugada, ele saía, recebia aquele chamado, vinham buscar ele em casa, e eu ficava numa, numa casa que eu fui morar, enorme, sozinha, Maria Lúcia! que medo que eu ficava! apavorada! . medo?. apavorada! então, e, mas eu acho que foi por isso que eu, que eu agora não ligo mais, sabe, já me desliguei, já não, não me importo mais, não. dá plantão, está tudo bem, então, eh, volta para casa. . [...] as actividades da senhora, não é, . é, por isso é que eu gosto de, de fazer meus exercício, minhas ginástica, minha ioga, porque s[...], se não, vou ficar aqui trancada dentro de casa o dia inteiro.. engraçado.... aí, eu moro.... porque nenhum dos meninos resolveu ser médico, não é, . nenhum! não, nenhum dos dois. eles sempre disseram 'Deus me livre ser médico para levar a vida que meu pai leva!' porque, quando eu, no princípio, eu, de casada, então ainda era pior, quando os menino, pegava muito plantões seguido. agora, não. há muito tempo até que ele não dava plantão, mas agora a policlínica, lá resolveu b[...], dar esses plantões. está com pouco médico lá, porque vai mandando gente embora, não é, . a policlínica de aonde? . é policlínica do porto. então, eh, tem poucos médicos e, e tem que dar plantão e ele teve que entrar na escala do plantão. ele não queria, porque ele d[...], detesta dar plantão. já deu, deu muito, quando ele era do exército, não é, ele era médico do exército dava, às vezes, seguida, sabe, ele ia para fora e, e, imagina você, ia acampar! . ai, que horror!. acampar! passava quinze dias fora, acampado. às vezes ia para, para fora, ia para, pe[...], p[...], vacinar, eh, vacina de tifo, essas coisa, então ia para, para santos, para não sei para onde, passava lá uma temporada. . e a senhora ficava sozinha? . e eu ficava sozinha com os meninos. olha, vou te dizer uma coisa, Maria Lúcia, até Natal e Ano Novo, eu passei muito sozinha, sabe, muitos natais e Ano Novo eu passei sozinha com os menino. e a minha nora reclamam da vida que, às vezes, os, os meninos, eh, chegam atrasados, chegam tarde, essas coisas, eu digo 'minha filha, vocês não devem reclamar, não. vocês levam até uma vida muito melhor que eu levei, poxa!' . mas eu acho, dona Mariângela, que a mulher hoje ela, sei lá, ela não aceita com tanta facilidade assim. . eu também acho. a mulher agora não aceita mesmo não, sabe, é porque foram habituadas, tiveram uma educação diferente, não é, eu é.... [...]. é isso mesmo.. [...]. eu acho que assim é que deve ser. . a senhora acha? . eu, ah! eu acho. eu acho, eu aprovo. eu sempre acho que, quan[...], ah, não, não acho ruim das, das mulheres que, assim serem independentes e trabalharem fora, eu acho que isso é uma boa mesmo, sabe, é uma boa! a mulher deve ser independente, nunca depender de marido. . é, mas, às vezes, os homens ficam muito ameaçados. os homens, os maridos. . ah! eles ficam ameaçados nada. eles ficam é, é enciumado. . pois é, nesse sentido [...]. eles ficam é com ciúmes, porque tem muita mulher que ganha mais que o marido.. [...]. conheço mui[...], muita mulher que ganha mais que o marido, e, e, e eles ficam assim enciumados, porque eles querem ser sempre os machões, não é, querem controlar ali. mas o, mas eu acho certo, sabe, a mulher ser independente, não depender de marido, não. . [...] |
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Brasil | Rio de Janeiro | F | 71 | Década de 80 | dona Dália, mas nós estávamos falando de religião, não é, . certo. . o brasileiro sempre diz que é católico, mas ele nunca pratica. . é, exacto.. é assim que você sente, também? . é, eu sinto assim, não é, eu, se passo na frente de uma igreja e me dá vontade de entrar ali, rezar um pouquinho, vou, rezo... e venho-me embora. inclusive não posso me ajoelhar. depois que eu fui atrop[...], sofri um acidente de carro. foi? . eu não posso me ajoelhar, é. . conte esse acidente. como foi esse acidente? . olha, o primeiro, eu vinha saindo do consultório, do raio-x. . ham.. tinha fechado o consultório, lá em Bonsucesso e vinha-me embora. eu nunca olhei tanto para atravessar uma rua como naquela noite. olhei para um lado, olhei para o outro, não vinha nada. vou atravessando, mas, contramão veio um carro, em toda velocidade, e eu, por instinto de defesa, não é, fiz assim para o carro, para empurrar o carro! aí, levei uma trombada no meio-fio, fui bater no outro meio-fio. então, bati, estava com esse relógio. hum, hum.. bati de barriga para baixo, não é, . sei. . com o joelho. assim, eu bati assim no chão. . hum, hum.. aí vieram chamar, era muito conhecida ali, porque eu sou assim, me dou com todo mundo, não é, aí, 'aquela moça do raio-x foi atropelada e tal!' e eu dizia 'telefona para o, para o Mourão Neto.' . sei.. que era o meu patrão, não é, o dono do raio-x. . hum, hum.. aí foram telefonar para ele. ele foi para o Getúlio Vargas me esperar. aí me pegaram e puseram dentro de um carro. mas eu s[...], estava sentindo só o joelho.. sei.. cheguei lá, o Mourão Neto estava pensando que eu estava toda arrebentada, não é, . ham, ham.. estava já com uma maca ali, que ele é médico, não é,. hum, hum.. e ele disse 'ah, dona Dália! eu pensei que a senhora estivesse toda arrebentada. não está não, graças a Deus.' aí fomos. no joelho não dava nada. e eu estava sentindo dor neste braço. esse braço é que é quebrou aqui. sei.. um pouquinho. aí ficámos naquele negócio, bateu radiografia, ele me deu para eu ver e tal, eu vi 'é, não tem fractura nenhuma, não'. mas eles me imobilizaram o braço, não é, . hum, hum. . e vim para casa, ele me trouxe aqui em casa, eu passei uma noite horrível, cheia de dores. . hum, hum. . aí ele de vez em quando telefonava para casa, eu sentada naquela cadeira e... eu atendia o telefone, e assim passaram-se uns dois ou três dias. ele disse assim - eu es[...], chamo ele pelo apelido, não é, tenho conhecimento com ele, não é, - 'Toninho, está doendo demais.' 'e a senhora estava chorando?' eu disse 'eu estou, chorando de dor.' 'então a senhora vem aqui no consultório'. mas nisso eu já tinha batido uma porção de radiografias, não é,. hum, hum.. inclusive eu lá na casa de saúde de Bonsucesso, quando uma das enfermeiras me viu, ela ficou apavorada, porque tinha visto eu ser jogada uns dois metros de altura e cair no chão. então ela pensou que eu tivesse morrido! . é. hum, hum.. quando ela me viu, disse 'dona Dália, como é que a senhora está andando?' eu disse 'pois é, não sei, é só o braço.' bom, a conclusão: aí eu fui bater radiografia no consultório aonde eu trabalho. um colega meu que bateu, não estava dando, aí, ele pegou e tirou. assim é que apareceu. . hum, hum.. eu tive que operar, depois tirar o pedaço do osso. bom, esse joelho ficou meio ruim. depois agora, aqui há uns anos também, com o meu neto numa kombi, que eu tenho horror a kombi. ele comprou uma kombi, eu ainda disse para ele 'ih, meu filho! sua avó não gosta de kombi.' 'ah! que nada avó.' bom, eu ia experimentar um vestido numa sobrinha na cidade. hum, hum.. que eu também coso, às vezes. e eu ia para lá, ele disse 'ih, avó, entra aqui.' tudo bem. quando nós íamos, depois da Praça Sêca, a kombi, esse negócio, eu não entendo muito bem não, parece que faltou freio, eu não sei o que é, de carro eu não entendo nada. . [...]. eu sei te dizer, minha filha, que o carro não parava de jeito nenhum. foi e ele, então, puxou para o lado do meio-fio, aonde tinha um caminhão, desses feito de alumínio, a kombi foi... . é. ih!.... lá de baixo, e ele pegou, porque ia eu e ele na frente, não é, eu assim com o braço no, nas costas dele. ele pegou, me puxou por aqui. ele saiu fora da kombi, ele caiu lá fora, não sei como ele não foi morto. . é.. e eu fiquei presa entre os ferros. também machucou esse joelho, o mesmo joelho, não é, . é.. e deu aqui, oh! aqui e aqui.. hum, hum.. deu aqui, talhos, e de maneira que eu não posso ajoelhar por causa disso, não é, . é.. tanto quando eu vou a, a uma missa, qualquer coisa, eu não ajoelho de jeito nenhum. não posso mesmo. tenho que ficar mesmo é em pé. |
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Brasil | Rio de Janeiro | M | 39 | Década de 80 | e o senhor joga, assim, lotaria, essas coisas? . no bicho, o senhor joga? . não, não gosto de jogo de bicho não. é um jogo muito legal mas eu não me adapto muito, não. não dou, não é questão de sorte, entendeu, é porque eu não gosto. entendo muito, mas não gosto. gosto muito, como eu te disse, é... corrida de cavalo, não é, que eu faço meu joguinho, ligo o rádio, escuto, torço, tudo. isso é que eu gosto. agora, jogo do bicho, lotaria esportiva, isso é um roubo! . loto.... isso, tudo é roubo, isso tudo é roubo! . ora mas um dia pode ganhar. . vou ganhar o quê? vou perder! . [...]. você ganhando, você está perdendo. você ganhando, você está perdendo. por exemplo, você desconta ali setenta por cento, você joga cem, só vale setenta. bom, setenta por cento. vocês estudam, sabem o que é setenta por cento, não é, você joga setenta por cento. suponhamos que você acerte no segundo semestre. você já está descontando setenta por cento do que você... ganhou, recebe o líquido, não é, descontado tudo, descontar, aquilo ali é setenta por cento é para pagar isso, aquilo, aqueloutro, imposto, tudo, não é, se você acertar esse dinheiro, no segundo semestre, o que é que te acontece, na próxima? você vai ter que pagar imposto daquilo que você ganhou. . é. . você já está sendo roubado de entrada, tem um jogo que te desconta setenta por cento, já é um roubo. você bota cem cruzeiro, só vale trinta, já é um roubo. é um roubo mesmo. agora, então, você desconta, ganha ou não ganha, desconta, você acerta no segundo semestre. como é que você vai investir seu dinheiro para você pagar, vamos dizer, você ganhou quatrocentos milhões de cruzeiro. no segundo semestre, como é que você vai investir seu dinheiro para pagar logo o imposto de renda logo a seguir, não é, como é que fica? por exemplo, no meu caso. como é que eu vou pagar tudo isso, esse imposto todinho? se eu botar o dinheiro lá encostado, eu vou perder dinheiro. sou solteiro, com esse dinheiro todo, ele vão descontar logo na maior, não é, quarenta e dois por cento, não é, se eu não me engano. um negócio desses não me interessa, que ele nunca vão me descontar. . hum.. e se eu investir eles também vão descontar. quer dizer que então, eu perco dinheiro toda vida. quer dizer que eu desconto na primeira vez que já vem descontado e vou descontar de novo! . mas corrida de cavalo, então, não tem isso? . corridas de cavalo, não. corridas de cavalo não tem erro não. . não? isso eu não conheço.. corrida de cavalo é o investimento dos rico, porque... o rico é o maior ladrão, não é, então é o seguinte, quando perguntam a ele 'porque é que', no imposto de renda, perguntam a ele 'como é, porque é que está sobrando esse dinheiro aqui?' 'eu ganhei na corrida de cavalo.' aquilo lá não dá recibo! você chega, joga e ganha. já é descontado já. lá tudo é descontado. você chega, joga, ganha, chega lá dá o talão, recebe e pronto. eles também não podem te provar contra.. é.. que é que ele vão falar? vai ver que ganhou até um cavalo deles mesmo, não é, . hum, hum.. você nunca ganhou, você nem entende de jogo de corrida de cavalo, mas fala que ganhou na corrida, pronto, acabou! não podem te falar mais nada. . e se o senhor ganhasse uma bolada, assim, que é que ia fazer com esse dinheirão todo da corrida de cavalo? . que é que eu ia faz[...], não, esse dinheiro não dá para ganhar muito não. graças a Deus, por isso é que eu gosto dele.. ah!. a gente só ganha pouco. é um jogo, jogo mais por esporte mesmo. eu jogo para ligar o rádio, ficar escutando, viu, e ter aquela vibraçãozinha assim. que de meia em meia hora a gente liga o rádio, não é, tem aquela vibraçãozinha. . Rádio Difusora Fluminense, não é, . Difusora Fluminense, Rádio Mauá também dá. . é, o senhor falou daquela vez Difusora... . é, não, a Rádio Mauá também dá! . ai é?. é. não, mas escuto a Difusora Fluminense, não é, porque é, é directo e a Mauá, quando tem futebol, dá futebol, também. . hum, hum.. e lá não, lá é só corrida de cavalo. a Difusora Fluminense é melhor, que é só corrida de cavalo. . mas o senhor nunca fantasiou assim se o senhor ganhasse, assim, uma bolada, que é que o senhor faria com tanto dinheiro? nunca.... que é que eu ia fazer? . não sei.. ia gastar do mesmo jeito! ia gastar. a única coisa que eu poderia fazer é o quê? comprar um iate, só. . viajar! . não, não ia para longe, não, ia ficar aqui mesmo. que é que há? no Rio de Janeiro mesmo, só nessas aguinha daqui só, água mansa. é. muita negra, não é, dentro do barco e pronto. a gente ia gastando, ia dando até ficar duro de novo. é a melhor coisa que tem é você ser sem dinheiro, viu, . porquê? . ah! você se sente feliz, porque você luta para ganhar ele, você sabe que tem dificuldade, você dá valor a ele. agora se você tiver dinheiro, não. tem problema não, posso gastar, porque tem lá para ga[...], para apanhar e gastar de novo. tem donde tirar. e agora, se você é dura, então você é, está sempre bem. você sai 'puxa vida' deve, tem momentos na vida que você pensa 'não posso nem morrer!' é. 'eu não posso nem morrer agora.' tem momentos não. [...] se você viver ou morrer para você é a mesma coisa. você pode não pensar assim agora, não é, mas um dia você ainda vai pensar 'poxa vida, se eu morresse hoje, eu morreria tranquilamente.' mas tem momentos na vida que você está botando a mão para o céu e - você não bota nem a mão para o céu, que você não tem tempo para isso - você está pensando 'Deus me livre, eu não posso morrer agora. se morresse agora, ia morrer com a consciência bem ruinzinha.', entendeu, por isso é... que... eu tenho essa ideia, o pobre é sempre feliz, porque ele luta, ele batalha pelo dia-a-dia. ele quer saber sempre que tem para ele comer, é o mais importante para ele, não é, . hum, hum.. quer saber que ele tem para almoçar, jantar e que ele vai lutar e vai ganhar mais para fazer a mesma coisa. mas já o rico não. o rico já pensa em como te pagar, não é, é a diferença. como te roubar para te pagar. tira de você para pagar a você mesmo, não é,. é a preocupação. . é, que você, você, vamos dizer, você é professora, você dá aula no colégio do homem, não é, você estuda lá também. quer dizer que ele está pensando como te roubar para te pagar! é isso tudo. |
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Brasil | Araquara - S. Paulo | F | 20 | 1995 | então, como eu estava falando, então, no direito romano, a mulher não tinha direitos. ela, ah, o di[...], o, a ca[...], a pessoa que ti[...], os que tinham capacidade de, de facto, que era capacidade de ter direitos de, direitos, assim, fora os direitos normais que todos têm que é direito de escola, educação, saúde, isso todos têm independente de ser débil mental, de ser... qualquer coisa. agora, depois tem os direitos, por exemplo, direito de montar uma fábrica, direito de, ah, é, assim, sabe, direito que envolve mais responsabilidade, mais coisa. então, a mulher não tinha, ah, os loucos e... dependia da idade, não é, no direito romano. que mais? ah! e tem muita coisa assim curiosa, sabe, que você fala 'puxa, mas isso não está certo.' então, tanto é que eles adoptam muito, tem leis que eles, tem caso de lei que a gente teve que estudar a lei mas que não vale mais porque o costume não aceitava a lei, sabe,. qual por exemplo?. espera aí, deixa eu pensar, do samba. eh, teve uma vez que, eh, numa constituição, eles lançaram que o samba era proibido no território nacional, aqui, certo, só que o costume, Brasil, é samba, não tem como. ah, o costume tirou a lei de, do vigor, de vigor, eh, essa lei não vale.. porquê o samba não podia?. ai, é, Marilim, eu não, não sei. era a lei que eles fizeram e, só que no, pelo costume não, acho que pela ditadura, não sei, ah, isso, mas foi o exemplo que o, o professor citou, que o... samba era proibido, só que pelo costume, tanto é que assim, ah, pensa no, no Código, por mais que sejam enormes, os gro[...], os Códigos, deve sempre aparecer coisa assim absurda que você fala 'puta, como é que foi isso surgir, isso?' então, eh, o juiz, ele tem todo o direito de, se não tiver na lei, por exemplo, se ele procurar na le[...], nas leis, nos Códigos e não tiver nenhuma lei dirigida àquilo que está acontecendo, ele não pode falar que ele não vai resolver porque não tem lei. ele é obrigado a procurar em costumes o que por costume aqui seria feito, entendeu, . ah! isso que eu ia perguntar.... então, é. ele, então, aí vai para o costume, tem o costume, a, que eles falam, a analogia, que, por exemplo, se tem uma lei que, ah, fala sobre a, f[...], fala sobre uma coisa mas não é bem isso que tem, que cabe ao, o facto que ocorreu, certo, aí ele pode fazer analogia dessa lei, quer dizer, fazer, dar um jeito nessa lei para ela caber dentro do que está acontecendo, sabe, então isso, quer dizer, Direito é difícil, não é, porque além de você ter que saber as leis, você vai ter reso[...], saber resolver problema que nem previsto é nem nada. . tem que saber o número da lei e tudo?. olha, os professores, eles sabem. eles falam assim 'a lei seis mil e quinze', que é a que mais usa, que é enorme, que tem quase tudo, é na lei seis mil e quinze. mas, ah, eu acho que isso você acaba, ah, pegando com o tempo, não é, mas eu acredito que número não, porque são muitas, não é, que nem isso, seis mil e quinze do Código Civil. aí tem Código Penal, Código Processual, Código, sabe, e cada, por exemplo, tem Código Civil, Código Processual Civil, Código Penal, Código Processual ci[...], ah, Penal, sabe, agora Processual, eu já não sei te falar nada porque a gente não entrou ainda. a gente só está em Código normal. mas tem, agora tem LICC, quer dizer, no começo eles falam 'LICC', você fala 'nossa, que é que é isso?' aí, sabe, com o tempo, você vai se tocando. é a Lei de Introdução ao Código Civil, então, que tem os direitos assim básico, que todo homem tem direitos. ninguém pode assim dizer que não conhece a lei, porque a partir do momento que ela foi publicada, só aí ela vai começar a valer, sabe, então que são as leis assim... comuns. aí depois.... e... conta um caso interessante que um professor contou.. acho que o mais interessante que eu lembro foi aquele da sucessão que eu te contei das crianças, tal, de, de, da, do filho que a moça estava grávida.. ah.... o cara era rico. acho que o mais assim que foi interessante foi isso.. e... trabalhista não tem nenhuma?. de trabalhista? não. só, teve no dia da, da, da mulher, não é, no dia internacional da mulher, foi uma moça lá, uma advogada essa que era mocinha, que eu já citei. ela foi lá dar uma palestra para a gente, não é, e ela é advogada trabalhista, na[...], ah, assim não tem nenhum caso assim que ela contou. ela só falou que, ah, que nem o, ela falou assim que o escritório dela é carpetado, é lindinho e que vai aqueles peão de chinelo e tudo sujo de barro, sabe, ah, e que eles vão lá assim, e [...] o, as pe[...], eles têm muito medo do advogado. eles nunca confiam muito no advogado, sabe, que eles estão sempre achando que o advogado está do lado do patrão, sabe, então quando você consegue alguma coisa, eles, sabe, eles falam 'ah! muito obrigado, dona, muito obrigado!', sabe, eles não acreditam que você conseguiu um direito para eles, um, eu acho que é isso porque, caso, caso não, porque o q[...], o advogado trabalhista acho que mais resolve é... coisa assim que é corriqueira mas que também não é certo, não é, por exemplo, acidente de trabalho, essas coisas mas eu não sei de nenhum caso assim para contar. |
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Brasil | S. Paulo | 2 F e 4 M | null | 1995 | quem não está nada satisfeito com o plano real é o sindicato dos artistas e técnicos em espectáculos. Zodja Pereira, directora do sindicato, acredita que a situação da categoria não difere dos demais trabalhadores.. eu acho que para o trabalhador, a realidade continua a mesma. e na realidade cultural isso fica... muito mais difícil. porque, particularmente no Estado de São Paulo, hoje, onde a gente vinha com alguns projectos... de cultura, de popularização da cultura, e isso tudo foi, ah, foi derrubado, foi uma derrocada muito grande.. segundo a sindicalista, o índice de desemprego no sector artístico está subindo. ela fala sobre a crise no governo do Estado e o plano real.. não, eu acho que uma coisa está ligada à outra. pelo menos foi por ter um problema de, de ordem financeira que o Estado de São Paulo, ah, provocou essa derrocada cultural. e, e eu entendo que se o real fosse um plano tão seguro e tranquilo, o... Estado de São Paulo, o governo de São Paulo teria tido condições de sustentar e garantir a cultura ao povo.. apesar de também sofrer com a herança de dívidas do antigo governo, quem está muito satisfeito com o plano real é o director-presidente do Memorial da América Latina, Fábio Magalhães. ele acha que o real é um plano que cria uma estabilidade monetária. com isso dá para prever orçamentos e projectos numa moeda estável.. bem, eu antes não tinha como prever o custo, nós tínhamos que usar uma moeda estrangeira para criar a previsão desses custos. e muitas vezes a inflação, ela superava até os critérios de você ter uma moeda estrangeira como ponto de avaliação. vamos supor, eu usava o dólar, então, esse evento está orçado em cem mil dólares. ora muitas vezes a inflação superava essa previsão mesmo em dólar. eu acho que hoje, com o real, se pode fazer uma previsão muito mais acertada. e fica mais fácil para o próprio empresário também trabalhar dentro de um orçamento cujos, cujos índices de inflação são extremamente menores do que daqueles, ah, que nós encontrávamos antes do plano real.. o Memorial está adoptando medidas para criar receita própria.. uma das medidas que já foi adoptada e teve uma boa, um bom resultado com o público foi a cobrança de ingresso nos nossos espectáculos. o público reagiu de uma forma muito positiva e esses recursos provenientes da bilheteria voltam para a actividade cultural da instituição. nós estamos agora a, vamos, devemos, a, a 'terceirizar' o estacionamento, o restaurante, a loja, enfim, dinamizar aspectos que possam gerar uma receita própria para a instituição. e por outro lado, nós estamos fazendo os nossos projectos junto da iniciativa privada. e essas parcerias ajudam a baixar os custos e muitas vezes a finan[...], a financiar a totalidade do projecto. essa é uma forma que nós estamos encontrando de superar as dificuldades de carácter orçamentários.. o ingresso no SESC Pompéia para o show Tetê e Lula e Lucina custava no primeiro dia do plano real sete e cinquenta. o show do Macalé no SESC Pompéia custa hoje doze reais, o aumento de sessenta por cento. no 'Vou Vivendo' os shows de Terça custavam seis reais no início do plano, com Os Cariocas, por exemplo, hoje, com Borguetinho, a entrada custa quinze reais, uma elevação de cento e cinquenta por cento. e o poder aquisitivo do povo? o real vale mais?. está valendo bem mais.. está conseguindo se divertir mais?. tem que ter um controle. você tem que ter um controle bem... forte sobre o dinheiro porque ele... diminuiu os números. entã[...], mas se você for fazer as contas, mas ele está valendo mais. está valendo bem mais.. e você está indo ao cinema, teatro, ou não?. eh, está dando para ir. a gente vai levando, segurando aqui, segurando ali, controlando bem, a gente vai indo assim. já vai.... está indo mais agora ou antes?. agora. agora está indo mais.. qual é que é a tua frequência? . a minha frequên[...], eu vou assim, vou dizer assim, mais às estreia, não é, duas, três por mês. duas, três.... e antes?. antes, aí, a gente ia uma vez a cada dois meses. uma vez por mês. demorava bem mais. por causa de muita inflação. você ia com um preço hoje e amanhã... já estava outro preço. então você ficava procurando ir de Quarta-Feira também que é mais, mais barato, não é,. a inflação, que antes era de cinquenta por cento ao mês e agora é de trinta e cinco por cento ao ano faz uma diferença brutal nas actividades culturais do país. a opinião é do cientista político José Álvaro Moisés, secretário de apoio à cultura. ele sente essa diferença no Ministério da Cultura, em Brasília.. este ano aqui, os projectos apresentados ao Fundo Nacional de Cultura, que é uma das, das linhas de atendimento aos pedidos e a, e aos projectos apresentados ao mecenato, quer dizer, a, a, na área da lei federal do incentivo à cultura, através das deduções do imposto de renda, esses projectos cresceram muito em, em número e também em recursos solicitados, está certo, no caso do, do, da lei federal do incentivo, os três primeiros anos de... mil novecentos, os três primeiros meses de mil novecentos e noventa e cinco registaram um crescimento de três vezes maior do que os três primeiros meses de mil novecentos e noventa e quatro. no caso do Fundo Nacional de Cultura, nós estivemos trabalhando, quer dizer, nós não, o Ministério da Cultura, até o final de noventa e quatro, esteve trabalhando com um total de cerca de quatrocentos projectos, para aqueles três anos: noventa e dois, noventa e três, noventa e quatro. só em mil novecentos noventa e cinco, o[...], nos seis primeiros meses, nós já recebemos mais de oitocentos projectos para o Fundo Nacional de Cultura, totalizando recursos solicitados na ordem de cem milhões de reais. isso o que é que mostra? mostra o vigor da área cultural, mostra uma imensa retomada das actividades artísticas culturais do país que foram possíveis a partir da estabilização da moeda.. a estabilização da moeda permite uma programação financeira mais real, segundo o presidente da Associação dos Produtores de Espectáculos Teatrais do Estado de São Paulo, Sérgio Dantino.. ao estabilizar a moeda, eh, eh, você ficou sem aquela loucura de, de, sabe, de trabalhar o dia inteiro, você perdia me[...], metade do dia, não somos sós nós em teatro, em qualquer outro tipo de ou[...], de outra... actividade, eh, cultural ou, ou, ou empresarial, você perdia metade do dia, tentando ver se o dinheiro não perdia o valor. e a outra [...] metade do dia você pensava em, em produzir. hoje você pode pensar em produzir o dia inteiro. você sabe que o teu, que o teu dinheiro está... aplicado ou, ou, ou, mesmo sem aplicação ele, a perda que ele vai ter se ficar um, dois dias na conta corrente é insignificante, eh, perto do, do, do que te aconteceu no passado. então você ficava a parte da manhã todinha, vendo o in[...], índice financeiro, indicadores financeiros, quanto é que vai dar o, quanto é que aumentou o dólar, compro o dólar, aplico nos CDBS, aplico nos 'comodities', não sei o quê. à tarde é que você ia ver, ver o que ia fazer com a sua fábrica, com o teu negócio, entende, agora não tem mais isso! então você tem muito mais tem[...], mais tempo para, para produzir. para pensar no s[...], no seu próprio negócio. se eu vendesse, por exemplo, ingressos antecipados e aplicasse o dinheiro, ah, da Quarta-Feira, ah, para entregar esse ingresso, a pessoa só ia usar esse, esse ingresso no, no, no Domingo, não é, eu só ia pagar a minha, minha, minhas, minhas... compromissos na semana seguinte, eu ganhava mais dinheiro no mercado financeiro do que, do que, do que no próprio ingresso, está certo,. dá para se divertir com o real?. não. nã[...], eh, quer dizer, eu não sei, eu acho que o plano está bom, porque... para mim não mudou nada, pelo menos não ter inflação já é uma grande coisa, você comprar uma coisa e saber que está ao mesmo preço. só que agora, nesses últimos dois meses, eu acho que teve uma inflação. principalmente com roupas, calçados e etc. então não está sobrando muito.. para ir ao cinema, teatro?. não. não está sobrando. não está sobrando porque, eh, eu, pelo menos, não é, eu tive aumento de condomínio, de escola - que o meu filho estuda em escola particular - e então, ficou meio apertado. faz dois meses, eh, veio vindo bem, bem, bem, nesses últimos dois meses, a coisa apertou um pouco.. aí corta a parte cultural.. aí te[...], a gente é obrigado a cortar, não é, porque, quando você tem que ir naquele, no que é obrigatório. no essencial, não é,. no essencial, é isso, aí já não dá. |
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Brasil | Rio de Janeiro | F | 44 | Década de 80 | agora, você falou que vai à escola de samba, todo ano?. vou assistir aos desfiles. . é? . todos os anos.. não é muito cansativo, não? . não, nós gostamos tanto. hum.. que passa bem. ah!. não dá nem sono, não é, todos os anos, nós vamos assistir.. conta um pouco do desfile. eu vejo pela televisão e não é uma visão real, não é, . olha, eu... não, já assisti futebol, no Maracanã e, mas não vou sempre, ele vai sempre com o garoto e eu não vou. então, ele diz 'Dora, assistir pela televisão é uma coisa e assistir lá, no campo, é outra.' . é. . a escola de samba é a mesma coisa. você ver a, o desfile no local é completamente diferente. é, é emocionante você ver o desfile. é. . de escola de samba. ah! é lindo! eu digo que todo brasileiro, pelo menos uma vez na vida, deveria assistir. . hum.. porque é um espect[...], depois porque, não é, são pessoa, a maior parte são pessoas humilde. é um sacrifício tremendo. é.. que fazem e é um espectáculo visual maravilhoso. que eu acho que no mundo não tem igual. . hum.. eu acho, eu acho maravilhoso mesmo, gosto muito. eu já assisti. s[...], se eu não fosse assistir mais, tudo bem, porque já assisti várias vezes. agora, quem nunca assistiu, deveria ver. . hum, hum. então, o ano que vem você assistirá outra vez.. se Deus quiser. isto é, ele ganha as entrada no palácio, eu estou lá.. ah! que bom.. o governador dá duas, olha aí. é. . acho que eu vou conseguir um emprego nesse palácio, que está muito bom. . é. o governador dá, não é, a, o oficial superior tem direito. então, ele ganha duas, é.. então, assim tem que ir mesmo.. é.. nesse, durante esse correr de ano, você viu alguma diferença, esses anos todos que você assistiu, alguma diferença, assim, gritante?. não. cada, cad[...], de ano para ano, elas vêm mais ricas, não é, . hum.. mais ricas já, e vejo a diferença o seguinte: ano pa[...], há anos atrás, você via uma minoria de brancos. hum.. desfilando, não é, hoje em dia, já está quase cinquenta por cento de brancos. que interessante!. cinq[...], ah! é. o branco está tomando conta das escolas de samba, não é, na minha família mesmo tem muita gente que desfila.. hum.. quer dizer, não frequenta a escola de samba. não mesmo.. eles não frequentam, entende, . hum, hum.. os ensaios, nada disso. agora, no dia, no dia do desfile, eles vão. é mãe, é pai e filhos, noras, tudo junto, na mesma ala. eles... . tudo unido. . é. eles vão. adoram.. e você não tem pretensões de sambar, por exemplo?. não. porque ele é, ele é militar, não é, então, eles ficam meio lá.. [...]. é. eles ficam meio assim, depois aonde trabalham, também, não é, no palácio, eles ficam meio, você sabe que os bicheiro estão muito... . deve evitar, não é,. ah! não é, na escola de samba e eles ficam meio receosos. . hum, hum.. porque, inclusive a mãe desse menino que está aí, ela é uma sambista, ela canta bem, ela dança bem e nunca desfilou, porque o marido é coronel, é o ajudante de ordem do governador. então, prende um pouco. . é.. eles, pas[...], nós vamos assistir, brincamos o tempo todo, não é, lá na arquibancada, mas desfilar, nós nunca desfilamos. . que pena.. é.. um dia, as coisas mudam.. é.. [...] desfilarem um pouco.. é. vamos ver. |
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Brasil | Rio de Janeiro | M | 30 | Década de 80 | ih, rapaz! assim eu, se eu fosse o presidente, eu tinha muita coisa para fazer. que eu ia ajudar todo mundo, não é,. que ele tem força, não é, . claro! eu ia tentar ajudar todo mundo, porque o presidente, entenda uma coisa, o presidente, ele tem força e não tem. o presidente é mandado, rapaz! o presidente é mandado. o que ele faz é mandado, rapaz! ele só praticamente, ele só tem nome de presidente. porque tem negro mais alto do que ele mandando nele, rapaz! . mais alto? . tem. o marechal.. ah!. agora tu não vês nem mais falar em marechal, mas tem marechal. e quem manda nele é marechal, rapaz! o presidente o que é que ele é? coronel? general? . general, não é, . o marechal é mais alto do que ele, meu filho! então ele é mandado. e presidente é indicado a dedo, assim: 'fulano, é o, agora é você que vai fazer besteira lá. vamos embora, é você.' . será que vai ter eleição para presidente? . tem eleição para, agora digo para você, tem eleição para presidente aqui? já teve alguma vez? . será que vai ter em oitenta e seis? . estão querendo fazer. estão querendo fazer. gente, e[...], eles agora estão querendo fazer tudo. que eles estão a fim de correr, eles estão a fim de sair fora. então eles vão fazer tudo. eles estão doido para entregar na nossa mão isso aí, irmão! também o que apanhar também é pato. a bomba que está? vai segurar uma rebordo[...], ou fica bom, ou então piora tudo de uma vez. ou então, entrega na mão do americano que isso aqui, praticamente, já é de americano. . mas talvez piore com isso. . ou piora, ou então melhora. porque o ri[...], o, o, o ritmo de um americano é diferente. e ele está só entrando aqui por dentro. e está entrando mole. está entrando na cara de todo mundo. e ninguém diz nada. há condição? não há condição, rapaz! os homem só querem ir lá fora apanhar dinheiro. não sei o que eles fazem com tanto dinheiro lá fora para apanhar dinheiro lá fora. e aqui, rapaz, a gente temos de tudo. de tudo! para ser um país, pô! rapaz! sinceramente, a gente não precisava apanhar dinheiro com ninguém não, cara! é a mesma coisa com o petróleo. o que é que a gente faz, a gente somos tão burro. o que é que a gente faz ao petróleo, aqui? a gente vende o grosso, depois ele vai lá, refina, e vende para cá para gente mais caro. não é burro? não somos burro? porque é que não tem refinaria, aqui? porque é que ele não faz isso também e vende para eles, eh, no preço que ele vende para a gente aqui? é burro. é burrice! está tudo errado, rapaz! está tudo errado, mesmo! o que tem aqui de legumes está fora de série. rapaz, a terra aqui é boa, rapaz! a terra é boa! mas para quê ir lá fora? para quê ir apanhar lá fora? não entendo, eu não entendo! sinceramente, até agora n[...], não estou entendendo nada. nadinha. |
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Brasil | S. Paulo | F | 23 | 1993 | e foi assim uma viagem que eu aproveitei muita coisa porque.... para qual cidade você foi?. eu fui para Porto Alegre mas, ah, eu fiquei em cida[...], hospedada numa outra cidade vizinha, se não me engano, aí de Esteio, é perto de Canoas, é uma coisa assim, e, mas depois eu peguei, junto com o pessoal da, da Federal de São Carlos, nós fomos fazer os circuitos das, ah, das vinícolas, não é, então, Bento Gonçalves, toda aquela região de, ah, de vinícolas e tal, ah, a go[...]. foi tomar vinho!. essa gozação eu aguentei depois, porque quando eu cheguei aqui, eu tirei foto para caramba, porque eu tirava foto de tudo o que eu via.... a do japonês, do japonês, lembrei, o japonês, tinha, tinha um japonês. não tinha.. errado, que você bateu errado. não foi aquela, foi a do Rio.. ah! errei.. não.... errou.. apaga.. não, essa foi uma outra foto, quando eu fui para SBPC no ano seguinte, que era o Rio de Janeiro, eu pedi para re[...], revelei um monte de fotos, não é, porque eu sempre que eu vou de tudo eu tiro foto, então eu tiro assim... tipo três ou quatro rolos de filme e dali eu aproveito quinze fotos, não é, então quando eu fui para o, para SBPC do Rio aconteceu isso, eu revelei as fotos só que no meio veio de uma japonesa, com uma criança no colo que até hoje eu não sei de quem se trata. ela de[...], deve ter alguma foto minha perdida assim como a dela, ela deve estar procurando até hoje, não é,. é.. então ficou guardada. mas quando eu cheguei lá no, em Porto Alegre, eu tirava foto de um monte de coisa, tudo o que eu via ia tirando foto e foi uma coisa assim muito gostosa porque o pessoal à noite, SBPC mesmo, ninguém passou nem na porta, não é, eu conheci a faculdade. não conta, não conta. eu conheci a faculdade, conheci cada luga[...], conheci onde era a universidade, não é, conheci como era a universidade, como estava dividida e tal, mas o c[...], as palestras, eu... não fui. [...]. porque eu achei nem, ah, nem, ah, não, não chego a, nem graça, eu ia, sairia da palestra aqui, sairia da USP para ver os professores da USP falar em palestra? . lógico.. não tinha nem sentido. então, quer dizer, hoje eu sei que não são só isso, tem... pessoas de fora. [...]. não, tem pessoas de fora. é mentira.. tem pessoas de fora que, que vêm, que trazem coisas interessantes, não é, então, o ano passado eu tive a oportunidade de ver realmente uma SBPC, de assistir, de participar, mas a de, a do Rio Grande do Sul, mais que era a primeira viagem fora.... era a primeira vez, você queria mais era aproveitar a viagem mesmo, não é,. exactamente. eu queria era aproveitar, ver o que dava para poder, assim, conhecer o lugar e eu acho assim que eu até aproveitei muita coisa, talvez não tenha aproveitado, ah, palestra de professores, coisas que eu não assisti.. talvez?. m[...], mas, por outro lado, eu acho que eu aproveitei muita coisa de conhecer uma outra realidade, então eu, quando eu cheguei aqui, eu cheguei com uma cabeça diferente no sentido de, primeiro, e quando você está dentro da universidade você não consegue ver as coisas bonitas daqui, você j[...], consegue ver é quando você está num ou[...], numa outra onde você, eh, poxa, a USP é tão bonita assim em termos de, geográficos mesmos, está, você vê em termos de população, como essas pessoas vivem, o que elas esperam, a própria recepção que elas têm com você, então, você chega, está todo o mundo assim 'ah, você vem de São Paulo?' nossa! parece que você veio assim de outro lugar, está todo.... te tratam como uma deusa.. todo o mundo te trata muito bem assim. você, ah, você quer sa[...], você quer saber o que esta aco[...], ah, as pessoas querem saber de você e querem s[...], assim, querem saber o, quem você é, o que é que você está acostumado a fazer lá e tal, elas são super, ah.... receptivas. receptivas e... eu assim achei superlegal, então acho que eu aprendi muitas coisas por esse lado, não é, até mesmo de você chegar numa cidade onde você não conhece, ter que se virar com guia, com mapa do lugar, então você, bom, ah, está certo, as pessoas falam a mesma língua, alguém te indica, então mas, mas em cidade, geralmente em cidade pequena acontece muito isso. on[...], você chega e fala assim 'ah, onde é o banco? o banco tal' eles falam assim 'é do lado da telefónica', quer dizer, não te [...] adianta em nada porque você não conhece onde é a telefónica.... [...]. exactamente.. que gracinha.. exact[...]. [...] a única que tem.... exactamente, você não conhece, por exemplo, um ponto que para eles são, é uma coisa comum, não é,. hum, hum.. então, ah, você perde esse referencial. então quem te guia realmente ali dentro são os mapas, não é, que foi a primeira coisa que nós fizemos quando chegámos lá, procurar onde era o serviço de turismo para poder pegar, pegar os mapas e tal, não é, ah, ver a questão de prá[...], de, do, d[...], assim, ah, ah, o quanto dete[...], ah, pelo menos para mim foi diferente ver assim como eles valorizam aquela cidade, como eles, embora Porto Alegre seja uma cidade bem grande, não é, você vê como eles valorizam, como um, um turista chega lá, eles querem te mostrar 'olha o rio Guaíba que co[...], passa ali, o nas[...], po[...], o nascer do sol é super, o poente é superlindo', não é, então, esse tipo de coisa, eles querem te mostrar o que têm de bonito na cidade, ah, você vê também até ques[...], determinadas coisas que, ah, para nós, ah, a nossa organização embo[...], você fica, para mim foi uma coisa que na época, principalmente porque eu estava estudando linguística, eu fiquei abismada, porque... eu entendia as coisas teoricamente e lá eu tive a oportunidade de ver isso na prática. então, por exemplo, lá a diferença de falares, lá eles falam por tu, tu, tu, o tempo inteiro, não é, e para a gente é superesquisito, embora a gente saiba que o português, que o correcto seria falar tu, não é, então essa diferença linguística, a diferença até de organização, então, por exemplo, eu lembro que tinha uma rui[...], ruazinha, você tem o guarda que ficou, ele tem visão nas quatro, nas quatro, das quatro ruas, ele fica numa pracinha, dali ele tem visão para quatro ruas, não é, então esse tipo de coisa, essa própria organização que hoje, aqui numa cidade grande, você não encontra, não é, e... a questão por exemplo de você querer ti[...], eu queria tirar foto de tudo, eu queria experimentar tudo, eu queria ver tudo, não é, agora, como a, a Leila já tinha falado . eu não falei nada.. que ela viu as, as fotos que, você não, acho que não conhec[...], você não conheceu, mas eu trouxe um monte de fotos de lá, a metade está, metade está mal tirada e a outra.... e, lógico, quem foi a fotógrafa, quem foi?. metade está mal tirada e t[...], e tem outras, perdão, p[...], ah, muito pelo contrário que eu esperava tirar a foto certinha. [...]. só que eu mexi de tal maneira na máquina que até ho[...], se eu tiver que fazer hoje eu não consigo. então, por exemplo, tem uma foto que nós tirámos numa duna de areia e que era para ter saído clara e, e muito pelo contrário, saiu o, o, saiu como se fosse um, um efeito especial, saiu só a sombra das pessoas naquela areia. então ficou muito mais bonito pelo efeito que pela foto re[...], verda[...], real, real, não é, a outra, uma.... [...] fotografias. uma outra, uma outra também que saiu assim foi de uma igreja que era na cidade de Canela, não é, então tem toda a história da igreja atrás disso e eu fui tirar a parte de dentro da igreja. todo o mundo que vê a foto, se vê, se eu mostrar só a foto fala assim 'aquilo parece coisa de igreja medieval', lembra, não é, pelo, pela maneira que eu coloquei o vitral. como eu fiz isso até hoje eu não sei. em contrapartida ao lado de.... [...] quem sabe uma inspiração, um espírito.. em contrapartida na, na parte de fora da igreja quando eu tirei a foto, eu estava assim, lugar que você não conhece e eu superpreocupada porque você tem documentos, você tem dinheiro, você tem, ah, você tem tudo ali, não é, e outra, eu estava fora de Porto Alegre, não é,. [...] ah, eu lembro. então minhas coisas estavam todas, ah, no alojamento de Porto Alegre e essa altura do campeonato eu estava já n[...], em viagem há dois dias com outra tu[...], com a turma de, ah.... São Carlos.. de São Carlos, da Federal de São Carlos para essas cidades. então, o que eu tinha era o que estava na minha bolsa, não é, então morrendo de medo, eu fui tirar a foto dessa igreja, eu coloquei a bolsa na minha frente e fui focalizar a igreja só que eu não sei como eu coloquei a máquina que saiu a bol[...], saiu a bolsa, a parte de ci[...], baixo da igreja e a parte de cima saiu cortada. não dá para você, você não vê a, a torre da igreja, não é, você viu essa foto? |
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Brasil | S. Paulo | M | null | 1995 | eu vou começar o programa lendo um poema do Manuel Bandeira, poeta brasileiro falecido em 1968, grande, grande Manuel Bandeira, tido por muitos como o poeta da simplicidade, aquele que conseguia dizer as coisas mais... profundas da forma mais... simples, poeta que caiu realmente na, no gosto do povo, caiu na, na, na, na linguagem do povo, quem é que não conhece a frase 'vou-me embora pra Pasárgada'? quem escreveu isso foi Manuel Bandeira:. todo o mundo conhece isso. eu vou ler um poema do Bandeira então e você pelo poema vai desconfiar do tema, certamente você vai descobrir qual é o tema do programa.. trata-se do poema, do genial poema, do antológico poema, do memorável poema 'Trem de Ferro', do Manuel Bandeira, poema que tem por si só toda a sonoridade de um trem, de um trem de ferro, trem directamente ligado à história do Brasil, à história do interior do Brasil, o Brasil que, por incrível que pareça, já andou de trem. do Brasil que depois genialmente, entre aspas esse genialmente, descobriu que o trem não presta, que o ideal é andar de ónibus, andar de caminhão; então num país continental como este, nós carregamos mercadoria em Porto Alegre e mandamos para Fortaleza num caminhão; lá vai o caminhão andando quatro mil quilómetros, um cidadão coitado sozinho, não é, nesse interiorzão do Brasil por estradas maravilhosas, nenhum buraco, nada, tudo maravilhoso, de primeira, lá vai o cidadão gastando energia, gastando pneu, gastando tudo, para carregar trinta toneladas, quando um trem sozinho, só, só um vagão, não é, leva oitenta, noventa, cem toneladas, imagine quanto não leva um trem desses de carga; o Brasil já andou de trem, não só na base da carga, os passageiros também. o trem está directamente ligado à história do Brasil, especialmente à história do interior do Brasil. os nossos avós andaram de trem, os nossos pais andaram de trem e o trem foi cantado em prosa e verso. |
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Brasil | Rio de Janeiro | F | 57 | Década de 80 | e escuta, os pais da senhora, eles faziam o quê? . meu pai é funcionário público. . hum.. era, era. agora é apo[...], aposentado, não é, e minha mãe era doméstica, trabalhava em casa. . nunca trabalhou fora também, não? . não, minha mãe nunca trabalhou fora. minha mãe nem não ia na rua fazer compra. . é?! . meu pai que fazia tudinho. meu pai que ia na, no açougue, na quitanda, antigamente era quitanda, não é,. é.. hoje, hoje é supermercado, não é, antigamente era na venda, não é,. na venda.. é. antigamente, era venda, não era supermercado. meu pai que fazia tudo.. [...] . minha mãe não ia na rua comprar uma verdura. depois nós fomos crescendo, ela mandava 'vai ali na quitanda comprar uma couve. vai na horta.' tinha, tinha horta aqui em Inhaúma, não é, minha mãe nunca [...] minha mãe não atendia telefone! . ah não?. ai, mandavam, quando mandavam chamar no telefone, ela não ia. ela não falava em telefone. . não gostava? . meu Deus! . não. . bem do... . é. mas, se você olhasse assim, não dizia. minha mãe era uma mulher que se vestia direitinho, assim, na moda.. hum.. entende, cortava cabelo, na moda também. mas não atendia o telefone. . certo! hum, hum. e escuta, dona Nadir, depois que o, que ma[...], daqui a alguns anos e tal, quando todos os filhos da senhora já estiverem casados e tal, a senhora, a senhora e o marido pretendem fazer o quê? . bom, eu, é o que eu digo. eu... falo para você, queria morar num apartamento, mas já vi, mas pelo jeito, vou ficar é aqui mesmo. meu marido não vai sair daqui mesmo. porque eu gosto daqui onde eu moro, entende, assim, dos vizinho. são muito bons vizinho - acho que eu já falei isso, não é, mas não gravou. . não, tudo bem. não tem problema.. são muito bons vizinho. são óptimo mesmo, sabe, são vizinho antigos. então, você, quando vai ficando numa certa idade, você tem que, você não depende de tudo, mas de um você depende. é ou não é? você não, não precisa depender de tudo que é vizinho, mas de um, você sempre, então é, aqui tem uma coisa, se eu passar mal, estiver sozinha, é só, tem vizinho de todo canto que vai me socorrer. porque eu já moro muito tempo aqui, meus vizinho também são antigo. tem gente aqui que é mais antiga do que eu. . hum, hum.. então eu tenho vontade de sair daqui, porque a ca[...], já disse, que a casa é grande e tudo mais. mas um momento fico pensando. eu vou para um apartamento, no apartamento você não arranja amizade. você não conhece vizinho. eu sei, porque a minha irmã mora lá, eu vou, canso e não conhe[...], nem sei quem é os vizinhos da minha irmã. como ela também não sabe. . certo.. e casa não. casa você faz amizade, porque você vai ali na frente, vai sempre varrer, limpar uma calçada. então, você faz amizade com vizinho, já apartamento, não. então, eu digo 'meu fim vai ser eu aqui mesmo nessa casa.' aí vem os neto passar dias. vem, não é, estão longe. 'ah! vou passar as féria com a minha avó.' aí vem. . hum, hum.. e casa grande de avó é bom! . pois é. tem lugar para os neto, não é,. pois é. . porque morar com filho, eu não quero não. só se for preciso, mas não quero não. . não, não é? . não dá certo. dá? . é meio difícil, não? . é meio difícil, não é, nora com sogra dar certo. é muito bom, você pode se dar muito bem, mas a nora lá e a sogra cá. juntou... . duas mulheres para cuidarem de uma casa... . com filha, mãe e filha, às vezes, não dá certo, quando casa a filha não dá certo morar junto. você vê nora... . é, é verdade.. não, eu me dou muito bem com a minha nora, entende,. hum, hum.. gosto muito dela, passo tempo lá e tudo, mas eu estou visitando, não é, agora, morar mesmo, no fim não dá certo. se for preciso, entende, eu não sei o dia de amanhã, não é, aí eu moro, mas... por vontade não. |
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Cabo Verde | S. Vicente | M | 54 | 1995 | portanto, estava-me a dizer, eh, estávamos a falar sobre a origem da palavra 'morna'.. sim. eh, dizem que a palavra 'morna' nasceu de, do vocábulo 'mourni[...]', 'mourning', eh, quer dizer que as pessoas que, que cantavam não cantavam, quer dizer, eh, sabe que às vezes quando no[...], eh, [...], como se diz, na, quando, eh, aconteceu que morreu alguma pessoa. sim. etc., então o inglês d[...], o inglês diz 'they are mourning'. hum, hum.. estão no sentimento do morto, etc.. hum, hum.. e então dizem que o senti[...], o senti[...], o sentimento, o canto da morna. hum, hum. saiu foi destas raízes.. hum, hum.. eu não sei se é verdade ou se é mentira. mas, eu digo, eu posso reproduzir aquilo que os mais velhos. hum, hum.. disseram. eu não sei se é verdade. mas, eh, eu acho, eu acho que até certo ponto pode ser isso. hum, hum.. porque, eu não vejo nenhum, nenhum vocábulo ligado à morna. bom, mas o que eu posso dizer é que a morna é realmente cabo-verdiana. hum, hum.. que, os mais velhos dizem que a morna nasceu na, na ilha da Boa Vista. hum, hum.. depois passou para a Ilha Brava e depois São Vicente, porque essas três ilhas têm, têm um contexto muito diferente, eh, no ritmo e na melodia da morna. eh, é natural que, que essa ideia de que esta palavra 'morna' tenha vindo. hum, hum.. a sua origem da, da palavra 'mourning'. a mim faz-me sempre uma certa confusão, eu sou dos Açores e nos Açores nós temos uma palavra 'mornaça'. e mornaça significa estar assim... a, a conversar assi[...], mas assim uma conversa mole, sem fazer nada. e eu . sim. na minha cabeça f[...], estabeleço sempre uma certa ligação... a morna c[...], assim o ambiente, um ambiente... não é calmo, não sei.... pode ser, mas, eh, eu não posso, quer dizer, eu não sei dizer directamente, porque, sabe que a nossa história tem muito para contar, não é,. hum, hum.. nunca, a história nunca foi contada devidamente, porque... claro que não foi escrita muito bem claro e etc.. hum, hum.. há coisas que ultrapassam.. claro! e qual é o interesse dos jovens actualmente por, por essas r[...], por essas raízes, ao fim e ao cabo?. eu acho que estamos a regressar às raízes.. hum, hum.. há algum tempo que eu estou notando se, que... a juventude está-se a interessar. hum, hum.. pela, pela, pela nossa cultura. eh, havia alguns anos atrás que estavam, estavam, quer dizer, um bocadinho afastados, mas agora estão a regressar, porque, quer dizer, isso é um fenómeno mundial. isto há, isto é mundialmente, agora neste momento, neste preciso momento, quase todas as nações do mundo estão a regressar. pelo que eu tenho visto é assim. através de rádios e gravações que eu tenho, que eu tenho acompanhado, estou a ver que quase todas as nações do mundo estão a regressar às raízes. e Cabo Verde também está a regressar, muito embora que há uma certa margem de juventude que acho, eh, querem estar ligados a, a coisas modernas, que não nos pertence. pertence a ou[...], a outros povos, a outras, a outras nações, etc., mas felizmente que o que estou a ver que há, há pessoas aqui na juventude que estão interessados mesmo pela raiz da cultura cabo-verdiana.. hum, hum. e, e há, há, há estruturas para corresponderem a esse interesse dos jovens pelas raízes?. essas estruturas estão um bocadinho fracas.. hum, hum.. estão um bocadinho fracas. eu não sei se é por falta de finanças ou é, ou é, se é por falta de... cultura no seu eu ou se é, ou não sei p[...], o que é que é esse fenómeno.. hum, hum.. mas, eh, temos muito que andar para chegar, para chegar até lá. porque... a nossa cultura aqui está um bocadinho enfraquecida mas, eu digo t[...], talvez por desinteresse ou talvez por falta de dinheiros.. hum, hum.. eu continuo fazendo a minha parte. hum, hum.. agora o resto eu não sei.. bom, cada um que faça a sua, não é,. sim.. diga-me uma coisa: mas, por exemplo, no que toca às mornas, eh, isso exige uma aprendizagem, não é, não é de um dia para o outro que a pessoa diz 'vou escrever uma morna' não há assim rapa[...], jovens à sua volta que tentem captar o espírito?. tem regras, não é,. tem as suas regras?. sim, mas, eh, nem, nem, nem, eh, isto é, isto é mais, quer dizer, como posso dizer? eh, eh, eh, isto é mais autodidáctico.. hum, hum.. eh, é u[...], é uma experiência autodidáctica, aqui. hum, hum.. em Cabo Verde. alguns às vezes chegam, vão perguntar-me como é, como é que eu comecei a fazer mornas, como é... o meu interesse, etc.. hum, hum.. eh, alguns têm interesse a aprender e outros não. mas, isso é, a maioria, a maioria aprende a fazer um mi menor ou um ré menor no violão, pronto, já sabe muito, e vai fazer, vai, vai compor e às vezes, vai escrever uma coisa que não está dentro de, da nossa tradição. por não ter aprendido, sabe,. hum, hum.. quem não, não estudou não aprendeu. eh, eles têm boa vontade.. hum, hum.. eles têm boa vontade. mas é que esta boa vontade não está bem dirigida. eu espero que no futuro as coisas tornam de uma maneira diferente para que eles cheguem onde querem. |
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Cabo Verde | S. Vicente | M | 48 | 1995 | estava-me a f[...], a falar então que prefere ver as borboletas em selos. é.. do que mortas. exactamente, sim.. em caixas, espetadas com um alfinete.. é verdade, sim. porque, eh, o animal é tão bonito que é, dá pena vê-lo espetado com o alfinete.. pois. e... também me disse que costumava mandar vir um catálogo.. ah, sim. eh, aqui orientamos pelo catálogo Donfil, é um catálogo que é editado em Espanha, eh, eh, is[...], isso sobre fauna. há muitas mais á[...], outros, eh, tipos, por exemplo, desporto, eh, plantas, etc.. hum, hum. e diga-me uma coisa: como é que, que ganhou essa ideia de coleccionar... selos, para começar?. bem, eh, dizem que... nós todos temos um pouco de... coleccionistas. pois.. n[...], coleccionei, com[...], comecei por... caixas de fósforos. sim.. depois por cromos. ham, ham.. até chegar então a uma colecção muito mais, eh, avançada. pois.. eh, é d[...], de filatelia, de selos.. pois.. e não estou arrependido. hoje tenho uma linda colecção que... é, faz a admiração dos meus amigos.. e que vale uma fortuna, não é,. não!. quanto é que calcula que vale a sua colecção?. bem, não sei dizer, é muito difícil. eh, nã[...], não há, neste momento não há em jo[...], não está em jogo o aspecto... monetário. sim.. mas sim o da cultura. porque agora já sei... muitas coisas sobre borboletas, que fui obrigado a col[...], comprar livros. ham, ham.. sobre o animal e... estudar algumas, eh, espécies, eh, os que havia aqui em Cabo Verde, etc. por isso que... é mais é, neste momento é com[...], mais como um passatempo do que... é fins, eh, monetários.. sim, sim. mas... as borboletas é um a[...], são um animal que vive muito pouco, não é, têm uma vida muito curta.. sim, por exemplo, há até, há alguns, por exemplo, há algumas espécies raras, dizem que, que, que s[...], que devem ser apanhadas logo ao, ao sair do casulo. porque senão perdem, eh, quebram as asas e então, eh, perdem qualidade. então, como no caso, por exemplo, dos que... coleccionam o animal vivo, então esse animal tem que ser apanhado logo... ao sair da, do casulo. sim.. para ficar completo.. porque esses selos, para serem feitos, eles baseiam-se em fotografias, não é,. exactamente, sim. mas é, hoje, por exemplo, eh, com a ciência avançada, como o senhor sabe, e, o animal pode ser filmado. e então é, é t[...], é toda essa maneira depois de reprodu[...], tentar reproduzir o animal.. quer dizer, o animal é filmado... sem, em liberdade?. em liberdade, sim. mas ele é, é, no seu... habitat próprio, não é,. pois.. por exemplo, sobre uma flor, sobre, assim mesmo, eh, em, em voo, é, é, é uma coisa interessante.. e depois então fazem a reprodução para o selo?. exactamente, sim. depois agora, por exemplo, eh, o, mesmo o desenhador pode ag[...], eh, que alguns...trabalhos são feitos com desenhos, então agora o, o desenhador agora idealiza o animal.. ah, pois. e, e us[...], pois, idealiza-se, pois.. sim.. e quando é, quando é desenhado, fica tão bonito como ando é, como quando é baseado sobre a fotografia?. sim. m[...], eu, a[...], acho de que... em, em de[...], desenhado, quanto a mim é até m[...], melhor.. ah, é?. sim! porque, por exemplo, eh, eh, não sei porquê, mas, eh, já com fotografia parece uma coisa, eh, como é que posso dizer? feito por máquina.. hum, hum.. agora, já desenho, já é, já dá outra, outra.... outra dimensão.. outra dimensão. é, é, é isso mesmo. sim. . hum, hum. e, portanto m[...], m[...], consegue-se ver da b[...], na borboleta, ah, que tod[...], as asas, as cores, isso tudo?!. exactamente, sim. to[...], por exemplo, todos, tod[...], os desenhos que, que o animal apresenta... e, e as cores.. hum, hum. é uma coisa fora de série!. portanto, o senhor Lourenço ao coleccionar borboletas, já me disse que aprende também coisas sobre a vida das próprias borboletas [...]. exactamente, sim.. eh, as borboletas como, alimentam-se todas de... fl[...], plantas, flores, não é,. é de néctar. néctar das plantas.. néctar.. exactamente, sim. e, apesar de termos aqui poucas flores, como o senhor sabe, Cabo Verde é um país seco. pois.. mas, eh, também é uma coisa: em cada quintal o senhor encontra... um... pequeno vaso... com uma pl[...], com uma planta.. hum, hum.. por exemplo, no meu quintal, é frequente descer borboletas.. hum, hum.. por exemplo, agora, por exemplo, na, Julho, Agosto, Setembro, como sabe, é a época das chuvas em Cabo Verde. hum.. então, as borboletas começam a aparecer. e isso antes do início das chuvas, está a ver, que tem toda aquela coisa de... colocar ovos, e depois da chuva então para... eclodirem as lagartas.... hum, hum.. então é, é, é, é frequente, nesta época do ano, ver borboletas no meu quintal. hum, hum.. por exemplo a, a 'Hipolimas Misupas', é uma borboleta... que é vulgar em, em, também a 'Danosso Crisupas', também, é uma borboleta vulgar em Cabo Verde.. hum, hum. e... o, as crianças... também, esse gosto por colecção de, coleccionar selos, eh, vai-se transmitindo às crianças mais novas ou não?. eh, bom, há um projecto para incentivar as crianças nesse capítulo. [...] e, então, nós, os mais velhos, estamos a j[...], fazer pacotes de selos usados, então para, justamente para... i[...], criar o.... o gosto.. o gosto pela filatelia... na [...]. nas crianças.. nas crianças. mas olhe, infelizmente na, na minha casa, nenhum dos meus filhos interessa pela filatelia.. engraçado.. mas o mesmo acontece também com os, com os meus amigos.. sim?. não há nenhum filho que... pode dizer nós vai continuar o meu trabalho.. [...]. pode ser que haja um neto!. sim. quem sabe?! [...], talvez mais tarde.. pois.. sim.. porque é uma pena, não acha que é uma pena perder-se tanto trabalho?. [...] sim! se[...], por acaso seria uma pena, mas, olhe, por exemplo, é da terra, vai ficar aqui na terra. eu se, quando partir, pronto! adeus borboletas! e adeus colecção! se tiver, eh, alg[...], alguém da minha família que lhe dê continuidade é bom, senão, se [...] vai para o lixo.. pois.. ou então se até vai ser vendida por tuta e meia.. pois. mas pode ser que algum dos seus filhos não se interesse agora e um dia mais tarde se interesse.. sim. é [...], é natural, mas, eu vou tentar... incutir, eh, o gosto pela filatelia.. pois.. aliás, por exemplo, quando chego em casa, com alguns envelopes com selos, eu... dou-lhes para... porem na água, e depois para descolar o selo d[...], mostrar-lhe a secagem, depois, como, como o selo é, é prensado para ficar, eh, bem... liso, não é, eu... tenho tentado de, isso, mas. hum. o entusiasmo é, neste, até este m[...], até esta, esta data, é relativamente... pouco.. pode ser. também depende da idade deles, não é,. sim. tenho um rapaz de onze anos, [...] pelo menos já devia ter, há coleccionado[...], há grandes coleccionadores que começaram... cedo.. sim.. mas... isto tudo. [...]. é tudo relativo. |
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Cabo Verde | S. Vicente | F | 55 | 1995 | mas olhe, desculpe voltar a incomodá-la por causa da, do tipo de prato... . ah! . aquilo é. por causa do prato.. portanto, serviam ali a cachupa, era?. portanto, a cachupa, servia para cachupa e não só. . e não só. . mas normalmente os trabalhadores, os lavradores das terras ou as, os trabalhadores necessariamente. . hum, hum. . davam o dia de trabalho e... . comiam. . e comiam. e se era para estar a, a dividir aos, aos pratinhos e, essa gamela era colocada ao centro da, da mesa. . e comiam todos dali? . e a[...], não! . não. . eh, tem a, a, há uma colher matriz, porque o prato é prato matriz. . sim, sim. . e há uma colher de panela que também é matriz. quer dizer que essa, eh, que é matriz, quer dizer, a c[...], a colher de panela. . hum, hum. percebi. . tam[...], ah, apanhava-se, servia-se então para os, para os pratos pequenos, aliás, eu tenho um prato pequeno. . e eram também... . ó, ó Zizi dá-me aí o prato pequeno, faz favor, olha... . e[...], eram, todos os pratos pequenos eram assim, não era louça, era tudo madeira? . não, era pratos que eu já venho mostrar. mas o mais interessante, de toda esta festa, esta questão, que eu vou contando, ah! também servia para quando, enfim, eh, se matava porcos... . hum, hum. . salgar, e era muito bom, porque... esse líquido sa[...], essa água... salgada que... . hum, hum. . ficava, era bom que ficasse aí na... . na... pois. [...] . e comiam bem porque este prato leva muito. . pois leva. ah! leva, leva! . já a gente, já se sabe que os trabalhadores trabalham mas também comem m[...], comem bem. . é uma verdadeira obra de arte. . e... o mais interessante de tudo isso - a Isabel também vai ouvir essa história minha - ah, lá para a zona do norte, em que realmente, porque é tradição toda a gente... ter uma cama de ferro em casa. . hum! . porque justamente para, e, e, quer dizer, isso é, é mesmo necessário ter, é uma exigência. é uma exigência em vez da madeira, ferro sim, por causa de, enfim, para o nascimento dos bebés. . hum, hum. . porque a parturiente terá de dar dores, acho que, de, de ter contracções - a Isabel já deve ter lido isso. . tenho lido sim. . nos meus contos. . hum, hum. . que é gravi[...], parto, 'Gravidez e Parto'. . sim, sim. . então, é para agarrar mesmo e para ter essa força. . pois. . para ter melhores contracções. mas há aquelas pessoas que realmente não tinham condições nenhumas e que ao fim e ao cabo acabavam por ficar na esteira. esteira, não sabem o que é? . eu penso que sei. . dá-me lá uma esteira, a esteira, faz favor, ah, está aí embrulhada. . [...] . 'intra'! . só um momento, sim? . [...] . ok. a esteira é esta. . hum, hum. . [...] . isso é... feito, o material é de bananeira. . ah! . é de, portanto, é a folha da bananeira, mas, aquela costura que fica aí ao meio, chamamos-lhe costura. sim, sim. . esta parte aqui. . sim. . então, é aberta, eh, as pessoas em vez de, não tinham colchão, por exemplo, cama, deitavam-se sobre a esteira. . mas aí não tinham onde se agarrar. . mas essa esteira, justamente, ah, o problema é este. o problema é que era difícil esse parto, em relação às pessoas indigentes e que tinham de se deitar na esteira. e é nesta medida que içavam, no cume, tecto, cordas. . hum, hum. . ou os cabos, cabos. . cabos. . exacto. . cabos. e então, a pessoa dava mesmo, tinha mesmo fortes contracções. . hum, hum. . incríveis contracções. e o bebé nascia à vontade e sem problema de rasgos. no entretanto estava aí a parteira, ou não, que normalmente não tinha parteira, diga-se em abono da verdade, mas o mais interessante desta festa é que as pessoas punham sal aí nisso. na[...], não tinha nada a ver com o sal, não é,. claro. . ah! quer dizer, o bebé... nascia, era, portanto, caía... . hum, hum. . hum. . na, o prato de figueira. . ah! . mas as pessoas, eu não sei porquê iam deitando. . portanto, servia para aparar o bebé também. . pois claro, iam deitando um, quer dizer, como se faz com as cabras, matar uma cabra, um cabrito, sei lá! . hum, hum. . e normalmente deita-se esse, esse sal. e as pessoas... . no bebé mesmo? . mas deitavam, sim senhora.. hum, hum. . porquê não sei, mas se calhar pensavam que isso devia ser igual à matança de uma cabra, ou não sei quantos. . não, penso que o sal devia ser desinfectante, qualquer... . pois. é isso. . será? . não sei. . ah! pode ser que seja. . é isso que eu ia perguntar. no bebé mesmo ou, ou na mãe? . pode ser que seja. não, no bebé, não, neste prato, que... . no prato. . no prato? . que recebia o bebé. . o bebé. . está bem. . ah, para amparar, caso houvesse, bem, isso não era preciso parteira, porque normalmente nem era preciso parteira. chegava uma pessoa... a ir com uma, uma rodilha. sabe o que é isso? . não. . é, portanto, é um, um pano que até pode ser... um vestido ou uma peça velha que se recortasse. hum, hum. . um lençol ou o quê. . sim. . que é feito assim... . sim. . ham, ham. . que é feito assim. . é enrolado. . hum. . é enr[...], sim. é, até porque é mesmo em, em rodilha. . sim. . pois, pois. . em roda. . [...]. em rodilha. . em rodilha, pois [...]. . para amparar, enfim, para que o bebé não nasça, não tenha de nascer, assim, a toda a velocidade, para, e evitando rasgos. . hum, hum. . e então amparavam. e é nesta medida que os bebés vinham lentamente, fossem gordinhos, grandes, pesados, ou quê, e estava aí a parteira, à medida que, enfim, que o bebé vi[...], i[...], ia saindo, lentamente, rasgo nenhum, na medida em que eu, por exemplo, eh, lá em casa somos doze... filhos. a minha mãe nunca teve esse problema, como ninguém teve. há lá mães que têm dezasseis e, minha avó, por exemplo, teve dezasseis filhos. mas, eh, falando... sobre essa questão aqui da, da gamela. as pessoas saíam, [...] acabavam de ter o bebé, normal, sem problema de rasgos, sem, sem fortes contracções, e... iam para a cozinha fazer o... pequeno-almoço. |
Spoken Portuguese - Geographical and Social Varieties
dataset source: https://www.clul.ulisboa.pt
(1995-1997 - European Commission DGXXII, Programme LINGUA/SOCRATES)
The project is concluded and the materials are published in CD-ROM, with the exclusive publishing support of Instituto Camões, under the title Português Falado - Documentos Autênticos: Gravações áudio com transcrição alinhada. Its distribution outside of Portugal is ensured by Instituto Camões and in Portugal by CLUL. From the original project a corpus of samples of the Portuguese varieties spoken in Portugal, Brazil, the African countries with Portuguese as its official language and Macao was derived. The published materials also include samples of the Portuguese spoken in Goa and in East-Timor, collected later. These samples of oral speech, recorded in various places, situations and periods of time, go together with the correspondent aligned orthographic transcriptions.
Finally, 94 speakers appear in the recordings; their characterizations (origin, sex, age, professional status, level of education) are visible on the header of each transcription, in which is also given information about the place, date and situation in which the recording was made, as well as other relevant types of information.
Main Goals of the Publishing
The use of authentic spoken texts in the teaching of Portuguese as a foreign language is not a common practice; instead, written texts are often used to reproduce the spontaneous speech, without any success. In fact, these artificial representations do not contribute to improve the knowledge of the spoken language; in order to fill this gap, authentic texts, collected in real communication acts with various types of speakers, are now published in CD-ROM: all these texts are samples of existent varieties and uses of spoken Portuguese. The user can read the orthographic transcription while he listens to the recording: the text becomes highlighted as the user is listening to its oral production. The user can listen to the all document or select some passages, as well as repeat or jump parts of the text whenever he wants. The orthographic transcription, besides improving the understanding of spoken texts, constitutes a consistent basis for the study of morphophonological, lexical, syntactic and discursive aspects of contemporaneous spoken Portuguese. The main goal of producing these CD-ROMs was to contribute to the improvement of the understanding (and production) skills in students of Portuguese as a second language of the advanced or superior learning levels. The materials are presented in a way that favors the use of self-learning processes. It is still worth mentioning that, since this corpus was not collected having in mind a specific user profile, it will be useful not only for students and teachers but also for researchers, translators and interpreters, among others, which will be able to select and analyze the materials according to their own particular aims.
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