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TÍTULO: Os Filhos e o Futuro
LOCAL: Macau
DATA: 1990
INFORMANTE
SEXO: M
IDADE: 40 anos
ESCOLARIDADE: 9 anos
PROFISSÃO: Funcionário público
- o senhor Silvério tem filhos?
-> tenho, tenho dois filhos.
- e que futuro é que, é que deseja para eles?
-> bem, espero que eles tenham um, um futuro, eh, eh, risonho, espero que ele tenha um s[...], um futuro mais promissor, espero que eles tenham um futuro... mais seguro, em termos de datas para eles programar a vida deles, espero que eles tenham um futuro para estacionar um local, sem ter a preocupação de fazer as malas e arrancar, espero que o futuro dele seja um, que possam abraçar uma profissão, eh, uma profissão... ligado a... actividades técnicas, eh, espero que o futuro dele seja, ah, dum, de homens assim normais, isto quer dizer que constituam a sua própria família, tenha a sua própria independência, criem também filhos, como... os antepassados deles criaram. pronto, espero que eles, eh, tenham uma vida e um futuro tudo para o normal.
- hum, hum. bom, eu referia-me, isto de se, gostaria que eles fossem funcionários públicos ou se entrassem na outra via?
-> depende. para, para, para qual, pronto, entre comas, o patrão que eles vão ter. se é para o Estado, se é o Estado português, da república, ou, ou se é a administração de Macau. empresa pública, também é claro, aí têm vários tipos de patrões, não é,
- hum, hum.
-> eh, eu, à partida, eh, diz[...], diria que... qualquer emprego que eles sintam bem está tudo bem. se é para a função pública ou não, eh, não importa. e principalmente estamos a entrar nos anos noventa, não é,
- hum, hum.
-> eh, é difícil fazer certas previsões, se o Estado é melhor, se a privada é melhor.
- pois.
-> se a engenharia é melhor ou a medicina é melhor. enfim, o fu[...], o futuro dirá, ou eles próprio, eu penso que eles próprios saberão escolher. porque neste momento, felizmente, eh, os miúdos neste momento têm um vasto mercado de escolha, quer para os seus passatempos, quer para os seus estudos, não é, que nós antigamente não tivemos todas essas oportunidades, daí que eu digo é difícil nós actualmente, os pais dos anos noventa, pensar ou imaginar, pronto, eu quero que o meu filho seja esse tipo de pessoas na comunidade, quando ele crescer. é difícil.
- pois.
-> é difícil preparar. é difícil imaginar, como é difícil, já não é possível, nós pais, impor s[...], profissões para os nossos filhos.
- antigamente era diferente, não era?
-> sim. antigamente era, era diferente. tanto que é diferente que antigamente os próprios pais podiam, eh, impor ou podiam, eh, forçar que os filhos entrassem no seminário. quando os filhos não tinham vocação para ser padre.
- hum, hum.
-> não é?
- pois.
-> é. mas neste momento já não é possível o i[...], ah, nós, pais, ter essa, essa força, não é, essa força que, é claro, eh, eu acho que, pronto, Macau, Macau, por estar talvez e situada na China, e muitas vezes também sofremos umas certas influências da China, não é, porque... os chineses, os pais, os chefes de famílias, tiveram sempre, pronto, o poder na mão, não é, é a pessoa que dita as regras, eh, dentro... de qualquer família. por isso, pronto, nós aqui, macaenses, também tivemos uma certa influência. depois misturado um bocado com a cultura portuguesa, não é, que... s[...], criou-se uma maneira de pensar, eh, muito, muito peculiar aqui da, da, da nossa terra. pronto, realmente, a história diz-nos e, como aliás muitos dos nossos, eh, eh, vá, muitas das pessoas mais a[...], a[...], adultas nos contam o poder que eles então tinha. e neste mom[...], momento, comparando com actualmente o que se, o que se vê
diariamente, os pais praticamente são os subordinados dos filhos, não é, porque tudo isto, quer dizer, tudo isto está a evoluir, já evoluiu, ainda continua, continuará a evoluir para mais ainda. penso eu.
- hum, hum
-> penso eu.
- acha que é pena os pais perderem essa autoridade que tinham antigamente, ou acha bem?
-> bem, eu acho que neste momento eu estou inclinado, sessenta por cento, que eu aceito, para o bem
- hum, hum.
-> quarenta por cento, não.
- hum, hum.
-> eh, sessenta por cento, digo, eu apoio porque acho que... assim podíamos dar uma formação, eh, aos nossos filhos mais para o natural. de acordo com as suas, eh, vocações, de acordo com as suas inclinações e, e habilidades pessoais, não é, eh, quarenta por cento não. por isso, esses quarenta por cento quer dizer que realmente estou numa, numa zona cinzenta. nem é carne nem é peixe. eu lá tenho a minha razão. porque, realmente, como pai, que neste momento já sou, eh, quer dizer, também vou sentir um bocado, eh, porque também passei por aqueles momentos em que eu assisti que os pais tinham muita força. e neste momento, que eu sou pai, vi que eu perdi esse a[...], essa força. por isso é que eu digo - é claro, com uma certa pena - que eu vejo que neste momento os pais estão a perder terreno. estão a perder terreno.
- eh, e daqui para o futuro ninguém sabe como é que vai ser, não é,
-> é verdade. é verdade.
- o futuro pode ser ainda muito pior. os seus filhos são pequenos ainda, não é,
-> ah, os meus filhos têm sete e dez anos, set[...]
- ah, já são grandinhos!
-> é, sete e dez anos. e agora com... a ajuda e, com, vá lá, c[...], a formação que eles estão a ter, com o apoio dos computadores, dos programas televisivos, educativos ou não, que eles assistem diariamente, com tantos jogos assim tão sofisticados, eles praticamente, a toda a hora, eles estão a ser treinados para os futuros homens.
- pois.
-> que, todo esse envolvimento, tudo o que neste momento os nossos filhos têm, nós antigamente nem, nem era bom pensar nessas coisas. quer dizer, termos triós para jogar já era muita sorte!
- pois.
-> não é,
- ter o quê?
-> os triós.
- triós!
-> os triós. que os triós que são, eh, berlindes!
- ah!
-> que nós chamamos que são triós, não é,
- ah! não sabia que se chamava aqui em Macau assim!
-> os triós, pronto, é mais uma influência inglesa, não é, o triol deu o triolas.
- ah! ah! não sabia disso!
-> hum.
- pois. eu também, eu nasci nos Açores
-> hum, hum
- de maneira que, eh, também era a mesma coisa. eu só vi televisão aos vinte anos! até lá, era um livro para ler e era muito bom.
-> então tive mais sorte que a si.
- pois.
-> vi a televisão, bem, eu também vi, vi a televisão a bra[...], a branco e preto, de Hong-Kong, não é,
- hum, hum.
-> quando estava ainda... n[...], no secundário. eh, eh, daí que eu digo que os nossos filhos têm muita e... muita sorte.
- pois têm.
-> muita sorte. mas oxalá que eles continue a ter essa sorte. ter sorte é agora, na infância. e depois quando chegar à adolescência, a situação inverter, aí é numa situação que, em que eles não podem usufruir
- hum, hum.
-> desses, desses benefícios, então que vai ser a, a desgraça.
- sei.
-> porque assim os miúdos vão sentir muito, não é,
- hum, hum.
-> por isso, neste momento, enquanto, nós os pais, enquanto Macau proporcionar, eh, esse tipo de educação ou esse tipo de entretenimento aos nossos filhos se, realmente eles têm, têm sorte.